Os eclipses solares são fenômenos naturais que possuem o poder extraordinário de nos reconectar com a grandiosidade do universo que nos cerca, além de carregarem um profundo significado científico.
Quando a lua se alinha perfeitamente entre a Terra e o sol, lançando uma sombra que temporariamente transforma o dia em noite, nossa imaginação é capturada, e através da história, os eclipses solares totais foram catalisadores para descobertas científicas notáveis, desde a revelação de elementos químicos desconhecidos no nosso próprio sol até a confirmação de teorias que redefiniram nossa compreensão da gravidade e do tecido do espaço-tempo. Vamos conhecer como três eclipses solares revolucionaram o conhecimento humano.
Halley
E se não tivéssemos a revolucionária teoria da gravidade de Isaac Newton? Pode parecer distante, mas se não fosse pela determinação do astrônomo e matemático Edmond Halley, essa poderia ter sido nossa realidade. Em 1684, um contemporâneo de Halley, Robert Hooke, afirmou que poderia deduzir as leis de movimento planetário de Kepler a partir de princípios mais simples, mas não conseguiu sustentar sua afirmação. Halley também se empenhou em resolver o enigma, sem sucesso, o que o fez recorrer a seu velho amigo Newton.
Para a surpresa de Hooke, Newton afirmou já ter solucionado o problema, mas havia “perdido” as anotações, e Halley convenceu Newton a reconstituir sua solução, o que resultou na criação de uma das mais significativas obras da física, a Principia Mathematica.
Halley era um admirador declarado do descobridor da gravitação universal, e com recursos próprios, financiou a primeira publicação do trabalho de Newton, o que foi crucial na divulgação de sua importância, e com isso, ele se tornou a primeira pessoa na história a prever com precisão um eclipse solar futuro, através da aplicação das novas leis gravitacionais de Newton.
Halley conseguiu prever com exatidão sem precedentes o momento e a trajetória de um eclipse solar total que cruzou Londres em 3 de maio de 1715 errando por meros quatro minutos e cerca de 20 milhas, um desvio possivelmente mais relacionado a registros imprecisos do movimento lunar do que a falhas nas leis de Newton.
A atenção do mundo se voltou para este feito que teve como efeito a celebração da genialidade de Newton e estabeleceu também um novo padrão em como mapeamos os caminhos dos eclipses. Halley introduziu um método de mapeamento com faixas escuras indicando as zonas de totalidade e parcialidade, uma técnica tão eficaz que permanece em uso até hoje.
A história da colaboração entre esses dois gênios expandiram a nossa compreensão do universo!
Janssen
Na metade do século XIX, uma nova técnica chamada espectroscopia capturou a imaginação de químicos, físicos e astrônomos. Esse método, que desdobra a luz em um espectro colorido, revelando a composição elementar da fonte, prometia revelações, apesar de ainda haver debates sobre a própria existência dos elementos, já que os átomos não haviam sido comprovadamente identificados!
Através da espectroscopia, pela primeira vez, astrônomos conseguiram determinar a composição de corpos celestes distantes com a mesma facilidade como se pudessem tocá-los, através dessa técnica que se tornou a base da astronomia moderna, onde cada imagem cativante de objetos celestes é acompanhada por uma abundância de estudos sobre seu espectro.
Com o sol sendo o objeto mais brilhante do céu, naturalmente tornou-se um alvo para estudos espectroscópicos. Astrônomos descobriram a presença de hidrogênio, ferro, oxigênio, carbono, entre outros, na atmosfera incandescente do sol, além de indícios de um elemento que desafiava a compreensão através de observações iniciais que sugeriam uma forma peculiar de ferro, mas nenhuma explicação se encaixava perfeitamente nos dados.
Um marco importante aconteceu em 18 de agosto de 1868, quando equipes internacionais de astrônomos observaram um eclipse solar total no sul da Índia e no Sudeste Asiático. Entre eles estavam Norman Lockyer e Jules Janssen, que estudaram os espectros das proeminências solares que se tornaram visíveis ao redor da silhueta ocultante da lua. Esses espectros revelaram claramente a presença de um novo elemento no sol, até então desconhecido na Terra.
Levaria décadas até que químicos na Terra conseguissem isolar esse elemento, posteriormente batizado de hélio, derivado de “helios”, a palavra grega para “sol”. O hélio foi o primeiro – e até o momento, único – elemento a ser descoberto no céu antes de ser encontrado na Terra.
Eddington
Apesar da elegância e precisão da teoria da gravidade de Newton, ela se mostrou incompleta e incapaz de explicar certos fenômenos, como a precessão da órbita de Mercúrio ao redor do sol, uma limitação que serviu de estímulo para Albert Einstein desenvolver a sua teoria geral da relatividade, que trata a gravidade como a curvatura do espaço-tempo induzida por objetos massivos.
Com a teoria da relatividade geral, Einstein pôde esclarecer os enigmas da órbita de Mercúrio, mesmo que isso tenha sido apenas ajustar sua teoria para se encaixar em descobertas que já eram conhecidas, mas o que ele precisava era de uma previsão que demonstrasse o verdadeiro poder de sua teoria.
Einstein rapidamente vislumbrou a possibilidade de usar a relatividade geral para prever o grau de deflexão da luz pelo campo gravitacional — ou seja, a curvatura do espaço-tempo — ao redor de um objeto massivo como o sol. A gravidade do sol deveria desviar ligeiramente os raios de luz que passassem perto. Normalmente, esse efeito é imperceptível, já que é incrivelmente pequeno e a maioria dos raios de luz de estrelas distantes não passa suficientemente perto do sol. Porém, durante um eclipse solar total, seria possível medir a posição precisa de uma estrela na borda aparente do sol e, então, comparar sua posição em qualquer outro momento para discernir essa deflexão.
A teoria de Newton também previa esse tipo de deflexão, e as primeiras incursões de Einstein derivadas da relatividade encontraram resultados idênticos. Em um artigo de 1911, Einstein incentivou os astrônomos a procurarem por esse efeito, e embora tenham tentado em vários eclipses subsequentes, suas tentativas foram frustradas pelo mau tempo.
Isso acabou sendo uma vantagem para Einstein: uma vez que ele refinou sua teoria, percebeu que seus cálculos indicavam uma deflexão mais acentuada do que a prevista pela gravidade newtoniana e buscou novamente a ajuda de seus colegas astrônomos, Frank Watson Dyson e Arthur Eddington, que aceitaram o desafio. Liderando duas expedições — uma para a ilha do Príncipe e outra para o Brasil —, esses astrônomos mediram as posições aparentes de estrelas próximas ao sol durante o eclipse solar total de 29 de maio de 1919 e as encontraram desalinhadas exatamente de acordo com as previsões de Einstein.
No ano seguinte, durante um jantar na Royal Astronomical Society, Eddington recitou um poema que ele mesmo escreveu, parodiando O Rubáiyát de Omar Khayyám:
“Oh, deixem os Sábios nossas medidas coligir,
Uma coisa ao menos é certa, a luz tem peso,
Uma coisa é certa e o resto é debate,
Raios de luz, quando perto do Sol, não seguem retos.“
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Eclipses artificiais
Nos dias de hoje, astrônomos que observam o céu a partir da Terra geralmente não precisam esperar por um alinhamento específico entre a lua e o sol para estudar o grande astro, graças a um instrumento engenhoso chamado coronógrafo. Esses dispositivos, que podem ser tão simples quanto um disco acoplado a um telescópio que bloqueia o sol com precisão, são frequentemente utilizados para examinar a atmosfera externa do sol, onde ainda existem muitos mistérios a serem desvendados.
Não sabemos exatamente por que essa região é extremamente quente, em comparação com a superfície visível do sol, por que possui campos magnéticos tão fortes e emaranhados ou por que é capaz de emitir um fluxo contínuo de partículas carregadas conhecido como vento solar.
Os eclipses naturais do passado revolucionaram o entendimento do universo até aqui, e hoje com a possibilidade da criação de “eclipses artificiais” estamos diante de muitas possibilidades que nos colocarão diante mais compreensão sobre a imensidão do cosmos…
Fonte: Scientific American