O filme ‘Oppenheimer’, de Christopher Nolan, tem causado furor na internet, mostrando que os avanços na ciência ao longo da História trouxeram muitas possibilidades, inclusive, algumas bem assustadoras.
Mas o que será que um renomado historiador nuclear tem a dizer sobre isso? Alex Wellerstein, professor no Instituto de Tecnologia Stevens em Hoboken, Nova Jersey, compartilhou sua visão com Lee Billings, em seu podcast, Cosmos, Quickly.
Para começar: estamos falando de J. Robert Oppenheimer, o físico teórico e diretor fundador do Laboratório Nacional de Los Alamos, muitas vezes visto como o pai do programa de armas nucleares dos Estados Unidos e da bomba atômica. Um sujeito complexo e, algumas vezes, trágico. Wellerstein, autor do livro “Restricted Data: The History of Nuclear Secrecy in the United States”(até o momento, não existe versão em português) de 2021, tem pensado e estudado sobre essa figura icônica por cerca de 20 anos.
O historiador passou muito tempo lendo cartas, arquivos do FBI e transcrições de audiências de segurança sobre Oppenheimer, por isso diz que assistir a um filme sobre alguém que ele estudou tanto é uma experiência um tanto quanto peculiar.
Uma coisa é certa: Oppenheimer não é o herói, mas um personagem complexo que vivia em tempos igualmente complexos. Wellerstein até mesmo mencionou ter encontrado versões não redigidas da transcrição da audiência de segurança de Oppenheimer, que haviam sido rotuladas e arquivadas incorretamente pelos Arquivos Nacionais.
Agora que já temos essa base, vamos direto ao ponto: o que o historiador Alex Wellerstein achou do filme?
Bem, Wellerstein admitiu que ainda não está muito certo de como se sente em relação ao filme. Como ele mesmo disse, “Depende do que você quer dizer com ‘bom filme’. Não é um filme divertido de assistir. Não foi feito para ser um filme divertido“. Mas, de acordo com ele, trata-se de um retrato interessante de Oppenheimer e faz uma melhor versão do cientista do que muitas outras versões cinematográficas.
Wellerstein concorda que pode ser um pouco difícil conectar os pontos da narrativa, mesmo para alguém que tem algum conhecimento em história nuclear, mas também afirma que essa é uma versão menos distorcida do que outros cineastas fizeram no passado, embora chegue a sugerir que talvez a história de Oppenheimer seria melhor contada em vários filmes ou uma minissérie, alegando que contemplar uma história tão vasta, – antes do Projeto Manhattan, durante o projeto e durante a Guerra Fria – , é muito para abordar em um único filme, o que deixa alguns aspectos sem profundidade suficiente.
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O entrevistador pergunta se Wellerstein acredita que o próprio Oppenheimer se veria como mal sucedido. O historiador aponta que o físico nunca expressou arrependimento pelo que fez durante a Segunda Guerra Mundial, e que, talvez, seu maior sucesso tenha sido fazer as pessoas entenderem que armas nucleares não são armas comuns e não devem ser usadas levianamente. No entanto, Oppenheimer provavelmente poderia ter se sentido mal sucedido, pois via um mundo onde as armas nucleares eram produzidas aos milhares como o pior cenário possível, perigoso e distante do ideal.
Wellerstein também explicou as aparentes contradições no comportamento de Oppenheimer, como seu apoio ao desenvolvimento da bomba de hidrogênio durante a guerra, mas sua posterior oposição a ela.
Ele descreveu que a visão do físico estava muito ligada à ideia que a ciência ofereceu ali a possibilidade de um futuro com armas super poderosas capazes de tornar a atmosfera radioativamente inabitável, sendo isso o que o impulsionou a promover o controle internacional e a proibição de armas nucleares, se mostrando eficiente nesse sentido, o que foi mostrado no filme através de seu sucesso em influenciar políticos como o secretário de guerra Henry Stimson, que entendeu a visão de Oppenheimer e propôs a negociação com a União Soviética para a proibição de armas nucleares, porém o historiador criticou o filme por retratar Stimson de maneira equivocada, como um político tolo.
Na primeira reunião que o secretário de guerra teve com Truman para informá-lo sobre a bomba atômica, quando Truman assumiu a presidência, Stimson ressaltou que estariam em posição de acabar com a civilização se não tomassem as decisões corretas. Ele estava levando a situação muito a sério e compreendeu completamente a posição defendida não apenas por Oppenheimer, mas por algumas outras figuras-chave.
Qual é a questão central de Oppenheimer?
Para Wellerstein, a questão central é: quais são as opções para o mundo daqui para frente? Ele destacou que a poderosa lição desse período histórico, especialmente a parte não retratada no filme, é de que naquele momento percebe-se a sensação de que haviam alternativas e escolhas a serem feitas.
Ele ressalta que hoje muitos dizem que não há nada que se possa fazer sobre o estado atual do mundo em relação às armas nucleares e que precisamos delas. No entanto, Wellerstein insiste que há escolhas, ainda que não sejam nada fáceis.
O historiador sugere que há maneiras práticas de pensar sobre o que seria preciso fazer para entrar em um mundo sem a ameaça existencial pela guerra nuclear, e que essas são as conversas que as pessoas deveriam estar tendo de forma mais ampla, em vez de ver isso como uma questão simples. E se o filme de alguma forma incentivar isso, ele consideraria um grande sucesso.
Fonte: Scientific American