Prever o comportamento humano é um desafio central enfrentado por pesquisadores, formuladores de políticas e líderes comunitários, principalmente diante de crises globais, como pandemias e a crise climática, e entender quais intervenções realmente impactam positivamente o comportamento humano pode contribuir em grande medida para promover mudanças em larga escala.
Nesse contexto, um estudo recente publicado na Nature conduzido pela Professora Dolores Albarracín e sua equipe na Universidade da Pensilvânia revelou insights valiosos sobre como efetivamente influenciar nossas condutas.
As abordagens tradicionais para influenciar as condutas não se mostraram muito eficazes até hoje. E isso se torna um problema quando dependemos de mundanças de conduta para a melhor qualidade de vida no sentido coletivo e individual, como, por exemplo, com a crise climática ou em pandemias.
Historicamente, as tentativas de mudar o comportamento humano frequentemente se concentraram na mudança de crenças e na disseminação de informações, mas este estudo mostrou que essas estratégias, embora bem-intencionadas, têm impactos mínimos na mudança real de comportamento. A suposição de que alterar as crenças ou aumentar o conhecimento sobre um assunto se traduzirá em ações concretas é simplista, apontando que há vários fatores intermediários que influenciam a forma como as pessoas processam informações e agem de acordo com suas crenças, tornando essa abordagem menos eficaz.
E quando há uma necessidade de uma mudança urgente dessas condutas, como em situações de crise climática ou pandemia, a demora dessas
Em vez de focar na mudança de crenças, os pesquisadores identificaram intervenções que realmente funcionam para influenciar o comportamento humano. Intervenções que oferecem suporte social e aprimoram habilidades comportamentais tendem a ter impactos mais significativos. Além disso, remover obstáculos práticos que impedem condutas desejáveis, como fornecer seguro de saúde para incentivar hábitos saudáveis, pode causar mudanças substanciais.
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Investigando sistematicamente o comportamento humano
Entre outros problemas, hoje enfrentamos graves situações decorrentes, por exemplo, da crise climática que assola o mundo e também o Brasil, o que coloca uma necessidades de mudanças de comportamento significativas para superar grandes desafios.
Para isso, entender como direcionar intervenções eficazes é fundamental. Para investigar o comportamento humano e então pensar como influenciá-lo, os pesquisadores desenvolveram um novo modelo que diferencia entre fatores individuais e sociais/estruturais, uma abordagem que ajuda a identificar os fatores que podem ser mais influentes em cada contexto.
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A metodologia
A metodologia usada para as conclusões deste estudo envolveu uma revisão abrangente de meta-análises relevantes que abordavam diferentes intervenções de comportamento. Uma meta-análise, grosso modo, é a análise de uma análise. Ou seja, uma técnica que analisa as análises feitas em estudos individuais, combinando dados e resultados de múltiplas pesquisas anteriores para obter uma conclusão mais abrangente e estatisticamente significativa.
É frequentemente usada na pesquisa científica para sintetizar evidências e tirar conclusões baseadas em um conjunto maior de dados, fornecendo assim um alto nível de evidência sobre a eficácia de intervenções ou associações entre variáveis.
Essas meta-análises foram feitas para apontar os determinantes de comportamento individual e social/estrutural, conforme definido por teorias comportamentais.
As etapas principais da metodologia incluíram:
1. O estudo começou com uma ampla revisão da literatura para identificar todas as meta-análises disponíveis que abordavam os fatores que determinam o comportamento humano e as intervenções para mudar esse comportamento. A pesquisa incluiu várias áreas, como saúde, meio ambiente, entre outras.
2. A equipe desenvolveu uma classificação abrangente dos determinantes do comportamento, separando-os em fatores individuais e sociais/estruturais. Isso foi baseado em teorias comportamentais e validado por meio de uma extensa revisão da literatura.
3. Para cada determinante, a equipe resumiu as evidências de correlação entre o determinante e o comportamento, bem como os resultados de intervenções experimentais e quase-experimentais que abordaram esses determinantes.
Em experimentos tradicionais, há uma divisão aleatória de participantes em grupos de controle e experimental para assegurar que as diferenças observadas entre os grupos sejam atribuíveis à intervenção. No entanto, em estudos quase-experimentais, a alocação para grupos não é feita aleatoriamente, seja por razões éticas, logísticas ou outras.
Isso significa que, embora as intervenções quase-experimentais tentem avaliar a eficácia de uma intervenção, elas podem ter variáveis externas que influenciam os resultados, tornando mais difícil determinar a causalidade direta entre a intervenção e a mudança de comportamento. No entanto, essas intervenções ainda fornecem informações valiosas sobre a eficácia de políticas e programas em situações do mundo real onde a randomização pode não ser possível.
4. Cada tipo de intervenção foi classificado de acordo com a sua eficácia em mudar o comportamento, desde negligível (o que pode ser desconsiderado) até grande. Isso foi baseado nos tamanhos dos efeitos obtidos nas meta-análises e nos estudos correlacionais.
Fatores individuais
Fatores individuais abrangem atributos pessoais, crenças e experiências de cada pessoa, e o estudo mostrou que intervenções focadas em conhecimento, atitudes gerais e promoção de habilidades de forma ampla têm efeitos mínimos em como nos comportamos.
Por exemplo, campanhas educativas que tentam mostrar às pessoas dos benefícios de certas práticas (como a vacinação) ou treinamentos para combater preconceitos, tendem a não alcançar seus objetivos.
Intervenções que direcionam atitudes específicas relacionadas ao comportamento, ajudam a desenvolver habilidades comportamentais práticas ou atuam diretamente para iniciá-los mostraram-se mais eficazes. Essas intervenções têm o potencial de modificar as condutas ao lidar diretamente com os fatores que influenciam as ações das pessoas.
O que aponta, por exemplo, que programas como os que incentivam a adesão ao tratamento de saúde fornecendo suporte prático, como reduzir os custos do copagamento do seguro saúde. Essas intervenções são mais eficazes porque removem obstáculos práticos que muitas vezes impedem as pessoas de aderir ao tratamento médico recomendado. Ao facilitar o acesso a esses serviços, as intervenções resultam em maior adesão ao tratamento, desenvolvendo hábitos mais saudáveis e práticos relacionados ao cuidado da saúde.
Fatores Sociais/Estruturais
Fatores sociais e estruturais, como leis, normas sociais, suporte institucional e acesso a recursos, também desempenham um papel importante na influência do comportamento humano. Por outro lado, o estudo revelou que sanções legais e administrativas e intervenções para aumentar a confiança em instituições têm pouco impacto.
Um exemplo que ilustra este ponto é a intervenção de impor sanções legais e administrativas para obrigar as pessoas a se vacinarem. Apesar das intenções positivas de tais regulamentos, essa abordagem não se traduz em uma mudança significativa no comportamento das pessoas no que se refere à vacinação. Simplesmente obrigar as pessoas por meio de sanções ou regulamentos legais muitas vezes não leva a uma adoção eficaz de comportamentos desejados, pois as pessoas podem resistir ou não se sentir motivadas a mudar.
Do outro lado, um exemplo do que funciona é, mais do que educar sobre vacinas, é fornecer vacinas diretamente no local de trabalho. Podemos citar também a criação de grupos de apoio para ajudar as pessoas a alcançar objetivos específicos de saúde. A remoção de barreiras práticas e a criação de redes de apoio social influenciam diretamente a capacidade das pessoas de adotar novos comportamentos de forma mais consistente.
Mudança de comportamento x crises
Essas descobertas têm implicações profundas para futuras políticas e intervenções e devemos come;car a pensar nisso urgentemente, visto que situações urgente, como a crise climática ameaçam as condições que viabilizam a vida humana.
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Muitas vezes, a implementação de políticas se concentra em aumentar a confiança ou combater a desinformação, mas este estudo sugere que isso pode ser ineficaz, apontando que uma abordagem focada no suporte social e na acessibilidade pode gerar mais efeitos concretos.
Os resultados também fornecem perspectivas importantes para intervenções futuras em crises ainda não estudadas. Durante a pandemia, por exemplo, o uso de máscaras tornou-se um comportamento crucial, mas havia pouca pesquisa sobre sua eficácia ou sobre como incentivá-lo, ainda que se mostrasse uma conduta essencial para a contenção do vírus.
A abordagem empírica abrangente desta pesquisa oferece um mapa para orientar esforços futuros para promover comportamentos que ainda não foram estudados diretamente mas que precisam ser promovidos durante uma crise.
Mudar o comportamento é um desafio inerente à complexidade humana, especialmente em situações de crise e isso demanda um questionamento rigoroso sobre como abordagens tradicionais focadas em crenças e disseminação de informações são ineficazes, apontando as estratégias que aumentam o suporte social, aprimoram habilidades comportamentais e facilitam o acesso a recursos são mais bem-sucedidas. Perspectivas assim podem garantir um entendimento que garantirá maior efetividade de uma gestão de crise eficiente, principalmente quando nos deparamos com tamanhos desafios do nosso mundo contemporâneo.
Fonte: Neuroscience News