Sabe o olhar dos cachorros com aqueles “olhos de pidão”? Pois é, tem muito mais do que o elemento para derreter nossos corações nesse olhar dos doguinhos!
Acreditava-se que essa expressão doce e inocente tivesse evoluído apenas nos cachorros domésticos como resultado da convivência prolongada com os humanos, mas uma nova pesquisa está abalando esse entendimento ao revelar que os cães selvagens africanos também possuem os mesmos músculos responsáveis por criar essa expressão, apontando novos insights sobre a evolução da comunicação nos caninos.
A pesquisa, publicada no periódico The Anatomical Record, começou com uma pergunta simples, mas provocadora: será que os cães selvagens também têm os músculos que produzem a famosa expressão dos “olhos de cachorro pidão”? A resposta, surpreendentemente, foi um retumbante SIM! O estudo, liderado pela anatomista comparativa Heather Smith, da Midwestern University, trouxe à tona uma nova perspectiva sobre a evolução desses músculos, até então atribuídos apenas aos cachorros domésticos.
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“Olhos de cachorro pidão” e a análise da evolução canina
Em 2019, um estudo revelou que os cães domésticos (Canis familiaris) possuem dois músculos específicos que possibilitam o movimento expressivo das sobrancelhas (ô, coisinha fofa!), criando a expressão que toca nossos corações: o nome de cada um desses músculos é levator anguli oculi medialis (LAOM, em português: levantador do ângulo medial do olho) e retractor anguli oculi lateralis (RAOL ou, em português, retrator do ângulo lateral do olho). Nesse estudo, lá em 2019, observou-se que esses músculos estavam quase ausentes em lobos (Canis lupus), levando à conclusão de que os cachorros domésticos desenvolveram essas estruturas para se comunicar melhor com os humanos.
A equipe de Smith, no entanto, decidiu investigar se os altamente sociais cães selvagens africanos (Lycaon pictus), conhecidos por sua comunicação vocal sofisticada, também poderiam ter desenvolvido esses músculos para se comunicar entre si. Ao dissecar um cão selvagem africano recentemente falecido do Zoológico de Phoenix, os pesquisadores identificaram que tanto o LAOM quanto o RAOL estavam presentes e bem desenvolvidos, sugerindo que não eram exclusivos dos cães domésticos.
“Pudemos ver fibras distintas que são muito proeminentes e muito robustas.”, disse Smith, destacando que é improvável que um único animal tivesse esses músculos tão bem desenvolvidos sem que eles também fossem comuns a outros indivíduos da espécie. Essa descoberta sugere que a evolução desses músculos pode estar mais profundamente enraizada na história dos caninos do que se imaginava, abrindo novas questões sobre a comunicação entre espécies.
Anne Burrows, antropóloga biológica da Duquesne University e coautora do estudo de 2019, reflete sobre as implicações desse achado, sugerindo que esses músculos podem ter sido perdidos pelos lobos ao longo do tempo, ao invés de serem um desenvolvimento único nos cachorros domésticos. A atual descoberta ressalta a importância de considerar uma pesquisa mais abrangente, considerando uma variedade maior de espécies ao estudar a evolução de características como os músculos faciais.
A equipe de pesquisa propõe que os cães selvagens africanos possam ter evoluído esses músculos para aprimorar a comunicação visual dentro de seus grupos sociais. Embora sejam bem conhecidos por suas vocalizações complexas para coordenação de caçadas e compartilhamento de recursos, as estratégias não-vocais de comunicação entre esses animais ainda não foram suficientemente estudadas.
Muhammad Spocter, anatomista da Des Moines University, elogia o estudo, mas alerta que a presença desses músculos não prova necessariamente seu uso para expressões faciais comunicativas, destacando que a presença dessa anatomia, não significa que, de fato, está sendo usada pelos animais. Ele coloca a necessidade de estudos futuros para investigar se os cães selvagens africanos realmente utilizam esses músculos da mesma forma que os cães domésticos.
O fato é que a descoberta de Smith e sua equipe não apenas coloca em xeque o entendimento anterior sobre a evolução dos “olhos de cachorro pidão”, e sugere uma complexa história evolutiva das espécies caninas a ser investigada. A compreensão da comunicação animal para além das vocalizações podem nos aproximar de novas perspectivas das interações sociais no reino animal. Mas independente da necessidade de novas investigações sobre os impactos em como os cachorros selvagens interagem entre si e qual o papel disso para uma nova visão da evolução canina, a gente sabe intuitivamente que nossos doguinhos manjam de derreter corações humanos, né?
Fonte: Nature