O teste de Turing é famoso no nosso contexto cada vez mais mediado por tecnologias avançadas. É uma menção recorrente frente ao destaque da inteligência artificial que apresenta a possibilidade de otimização de processos, oferta de soluções práticas, além de se mostrar com um grande potencial em campos que exigem complexidade e nuances que são da ordem da complexidade humana, como é o caso do julgamento moral.
Recentemente, um estudo conduzido por Eyal Aharoni, professor associado do Departamento de Psicologia da Universidade Estadual da Geórgia, revelou resultados surpreendentes que podem redefinir nossa compreensão sobre a capacidade da IA em entender e replicar raciocínios morais, chegando até a sugerir um novo teste de Turing.
Inspirado pela ascensão de modelos de linguagem de IA, como o ChatGPT, Aharoni se propôs a investigar se essas ferramentas poderiam contribuir com perspectivas válidas para questões éticas, especialmente aquelas que permeiam o sistema que dá conta de legislação.
O método utilizado foi uma variação do famoso teste de Turing, desenvolvido pelo matemático Alan Turing nos anos 50, que, na versão frequentemente referenciada nos contextos atuais, é, grosso modo, uma proposta de um cenário onde um humano, que seria uma espécie de “juiz”, interage com um computador digital que tentaria se passar por um outro humano. O humano “juíz” teria o objetivo de identificar se estava interagindo com outra pessoa ou com uma máquina, sendo possível verificar se o computador poderia imitar a inteligência humana a ponto de se passar por outro ser humano
No estudo de Aharoni, uma adaptação interessante desta versão do teste de Turing foi feita: os participantes, estudantes universitários, recebiam respostas a perguntas éticas tanto de outros humanos quanto da IA, mas sem a informação sobre a origem das respostas. Eles então avaliavam as respostas com base em atributos como virtude, inteligência e confiabilidade.
Os resultados foram surpreendentes. Contrário ao que muitos poderiam esperar, as respostas geradas pela IA foram consistentemente avaliadas como mais favoráveis do que as respostas humanas. Os participantes julgaram essas respostas como sendo mais virtuosas, inteligentes e dignas de confiança, indicando que a IA não só conseguiu emular raciocínios morais complexos de forma convincente neste “novo teste de Turing” mas também o fez de maneira que impressionou positivamente com os avaliadores humanos.
A surpresa do “novo teste de Turing”
Após a revelação de que algumas das respostas eram geradas por computador, os participantes expressaram surpresa, pois muitos não suspeitaram que estavam interagindo com uma máquina, o que sugere que, ao menos neste contexto, a IA passou no que Aharoni chamou de “teste moral de Turing”, um sinal de que estamos entrando em uma era onde a IA pode não apenas replicar, mas potencialmente melhorar o raciocínio humano em áreas delicadas como a ética.
Os resultados do estudo trazem à tona questões significativas sobre a crescente influência da IA em nossos processos de decisão. À medida que essas tecnologias se tornam mais integradas em nossas vidas, entender suas capacidades e limitações torna-se fundamental para entender o papel dessas ferramentas e o nosso. Há uma clara possibilidade de mudança de confiança em direção à IA para orientação moral e ética, o que destaca a necessidade de explorar como essa confiança pode ser administrada e regulada.
A crescente dependência de ferramentas de IA, como sugerido pelo estudo, também levanta preocupações sobre os riscos a longo prazo. Confiar mais na IA do que em humanos pode trazer desafios, especialmente em situações onde a distinção entre respostas humanas e automatizadas não é clara. O “novo teste de Turing” coloca sob os holofotes a importância de uma abordagem onde a tecnologia é usada como uma ferramenta para aumentar, e não substituir, o raciocínio humano, nos levando a pensar como se relacionar com essas ferramentas quando o assunto for confiança e atribuição de responsabilidade, por exemplo.
A presença da inteligência artificial é cada vez maior e tende a aumentar significativamente nos próximos anos, e os resultados do estudo de Aharoni nos lembrar sobre como nossas interações com a IA podem ir muito além do que imaginamos, e que as capacidades que essas ferramentas têm demonstrado, não se limitam a tarefas repetitivas ou computacionais, como outrora se pensava, se estendo agora a uma capacidade considerável para atuar no domínio das decisões morais, um território tradicionalmente considerado exclusivamente humano.
O “novo teste de Turing”, que não tem esse nome técnico, mas está sendo assim referenciado, desafia nossa compreensão das capacidades da IA, e nos convida a refletir sobre o papel que queremos que essa tecnologia desempenhe em nossa sociedade, como balancearemos seus benefícios com os imperativos éticos e como isso terá influência na nas relações da coletividade. As respostas a essas perguntas moldarão o futuro da tecnologia e, por extensão, o futuro da própria humanidade.
Fonte: Neuroscience News