Quem nunca se pegou imerso em momentos em que a criatividade toma conta, a ponto de perder a noção do tempo? Esse estado, em que a produtividade e a criatividade parecem se amplificar, é conhecido como “flow“, ou estar “in the zone“. Mas o que realmente acontece em nosso cérebro durante esses momentos? Um estudo recente da Drexel University’s Creativity Research Lab, focado em guitarristas de jazz da região da Filadélfia, trouxe importantes conclusões sobre o assunto!
O conceito de flow foi profundamente investigado pelo psicólogo Mihály Csíkszentmihályi na década de 1970. Desde então, a ideia de que podemos alcançar um estado de consciência ampliado, em que a criatividade flui livremente, tem sido um chamariz tanto para a psicologia quanto para as neurociências. No entanto, apesar de décadas de estudos, apenas recentemente começamos a entender o que acontece no cérebro durante o flow. A pesquisa da Drexel levou essa investigação a um novo patamar, mostrando que o fluxo não é apenas uma questão de foco intensivo, mas sim de uma complexa interação entre habilidade e desapego.
A metodologia da investigação da criatividade
O estudo contou com a participação de 32 guitarristas de jazz, de novatos a veteranos, que foram submetidos a sessões de improvisação musical enquanto usavam toucas de eletroencefalograma (EEG) para medir a atividade cerebral. Os participantes improvisaram sobre sequências de acordes e ritmos fornecidos, enquanto avaliavam seu próprio nível de fluxo durante as performances. Essas improvisações foram posteriormente analisadas por juízes especialistas em criatividade.
As descobertas apontaram que os músicos mais experientes, que relataram altos níveis de flow, mostraram uma atividade cerebral distinta, havendo uma redução significativa na atividade dos lobos frontais, responsáveis pelas funções executivas, como planejamento e controle cognitivo. Paralelamente, observou-se um aumento na atividade das áreas cerebrais relacionadas ao processamento sensorial. Isso sugere que, durante o flow, o cérebro diminui a supervisão consciente, dando mais espaço à criatividade, permitindo que uma rede especializada em processamento criativo tome a frente.
Os resultados também sublinharam a importância da experiência. Os músicos mais experientes não só entraram mais facilmente em estado de flow como também produziram improvisações consideradas mais criativas pelos avaliadores. Essa correlação entre experiência e capacidade de alcançar o flow apoia a ideia de que a excelência em uma habilidade é pré-requisito para que esse estado possa ser atingido de forma eficaz.
Flow vs. Criatividade Não-Flow
Curiosamente, o estudo demonstrou que a criatividade em estado de flow é diferente da criatividade em estados não-flow. Enquanto a criatividade convencional parece depender mais da rede de modo padrão do cérebro, que é ativa durante a introspecção e o devaneio, a criatividade de flow parece desviar dessa dinâmica. Não há a necessidade de um controle direcional externo, e em vez disso, o cérebro utiliza redes especializadas que foram aprimoradas através de anos de prática.
O que isso significa para criativos de todas as áreas, de músicos a programadores, de escritores a designers? O estudo sugere que a chave para acessar o estado de flow não está simplesmente em tentar mais, com mais dedicação ou focar intensivamente. Pelo contrário, após atingir um alto nível de habilidade, o segredo pode estar em aprender a “soltar as rédeas” e permitir que a mente opere com uma liberdade quase subconsciente.
Esta descoberta é um convite para repensarmos nossa abordagem da prática criativa. Como mencionado por Charlie Parker, lendário saxofonista de jazz, “Você tem que aprender seu instrumento… e então, quando finalmente subir ao palco, esquecer tudo isso e apenas tocar.” Essa capacidade de desapego, apoiada por uma sólida base de habilidade, pode ser o que separa os bons dos verdadeiros artistas.
O estudo da Drexel traz uma visão interessante em relação à criatividade, abrindo caminhos para pesquisas futuras que poderão explorar métodos para facilitar a transição para esse estado fértil para criar. Para indivíduos e organizações que buscam maximizar a criatividade e a produtividade, entender e aplicar os princípios do flow pode ser a chave para desbloquear um novo nível de desempenho artístico e profissional.
Esta pesquisa sugere que a excelência e a inovação vem não apenas de praticar, mas também de saber quando deixar a prática guiar você, de forma quase intuitiva para que a criatividade flua!
Fonte: Neuroscience News