Em busca do entendimento sobre nosso cérebro, uma promessa revolucionária chamou atenção em 2022: a técnica DIANA (Direct Imaging of Neuronal Activity, imagem direta da atividade neuronal, em tradução livre). Imaginem poder observar, em tempo real, os neurônios em ação, um avanço que poderia transformar nosso entendimento sobre o cérebro.
Mas, quase dois anos após a sua apresentação em um estudo na revista Science, a técnica ainda não foi validada por pesquisadores externos ao grupo original, levantando questões importantes sobre a confiabilidade e a reprodutibilidade na ciência.
A DIANA prometia um avanço significativo em relação às técnicas de imagem por ressonância magnética funcional (fMRI, do inglês Functional magnetic resonance imaging) convencionais, que dependem de detectar mudanças no fluxo sanguíneo do cérebro para inferir atividade neuronal, uma abordagem que tem uma limitação crítica: o atraso de pelo menos um segundo entre a atividade neuronal real e a mudança detectada. A técnica DIANA, por outro lado, trazia uma solução para poder rastrear essa atividade diretamente, sem esse atraso, representando um marco potencial na neurociência para investigação do cérebro humano.
No entanto, a empolgação inicial encontrou um obstáculo considerável: a reprodução dos resultados. Pesquisas subsequentes, incluindo duas publicações na Science Advances, não conseguiram replicar os achados originais, sugerindo que os resultados poderiam ser atribuídos a erros experimentais ou à seleção intencional de dados que favorecessem a hipótese dos pesquisadores. Essa dificuldade em replicar descobertas aponta para uma característica importante da ciência: a adoção de procedimentos rigorosos e transparentes.
O pesquisador líder da técnica DIANA, Jang-Yeon Park, físico de ressonância magnética (MRI) da Universidade Sungkyunkwan em Suwon, Coreia do Sul, defende os resultados, expressando curiosidade sobre as falhas de replicação por outros grupos, sugerindo que diferenças metodológicas entre os estudos podem estar na raiz do problema. A revista Science, por sua vez, enfatizou a importância de reportar resultados negativos, mas também indicou que as diferenças metodológicas impedem conclusões definitivas sobre a validade dos trabalhos originais.
Seleção de dados compromete o avanço da compreensão do cérebro
A metodologia proposta pela metodologia DIANA era intrigante: através de choques elétricos menores aplicados a um animal anestesiado, um scanner de MRI (imagem por ressonância magnética) coletava dados de pequenas partes do cérebro rapidamente. Isso, teoricamente, permitiria visualizar a atividade neuronal, ultrapassando os sinais mais lentos gerados pelas mudanças no fluxo sanguíneo, que são o foco do fMRI convencional.
As tentativas de replicação revelaram pontos críticos. Por exemplo, um estudo mostrou que sinais semelhantes aos descritos como atividade cerebral só apareciam quando dados não conformes eram removidos, levantando uma bandeira vermelha, pois, em teoria, agregar mais dados de diferentes partes do cérebro deveria fortalecer o sinal de atividade, não o contrário.
A comunicação subsequente entre Park e outros laboratórios revelou que, no estudo original, dados de algumas fatias cerebrais foram excluídos para manter a consistência entre os animais e eliminar ruído de fundo. Essa seleção de dados não foi inicialmente divulgada, o que Park admite ter sido um descuido. Tal prática pode levar a uma interpretação errônea dos resultados, pois sugere que a seleção de dados pode ter influenciado as conclusões do estudo.
Diante desses desafios, a Science expressou preocupações editoriais sobre a adequação dos métodos descritos no papel para permitir a reprodução dos resultados. Park prometeu fornecer informações adicionais para facilitar a replicação dos estudos, mas isso levanta uma questão crucial sobre a necessidade de clareza e transparência na ciência.
Além disso, tentativas independentes de replicação encontraram sinais semelhantes ao DIANA mesmo em condições onde a atividade neuronal seria improvável, como em ratos mortos, sugerindo que os sinais detectados poderiam não estar relacionados à atividade neuronal como se pensava inicialmente.
Apesar desses contratempos, Park continua a refinar a técnica DIANA e reporta estudos em andamento, tanto em animais quanto em humanos. Esse impasse científico destaca a importância da colaboração e da comunicação aberta entre pesquisadores. As dificuldades enfrentadas pelos grupos tentando replicar os resultados do DIANA também apontam para a possibilidade de avanços futuros na medição direta da atividade neuronal, estimulando a comunidade científica a explorar novas direções.
A investigação do cérebro pela metodologia DIANA é o reflexo do critério rigoroso que deve ser adotado na ciência para que qualquer conclusão, ainda que provisória, possa ser assumida como válida.
Fonte: Nature