Para se instalar, uma doença precisa superar algumas barreiras. Já se perguntou por que, às vezes, você pode estar rodeado de pessoas espirrando e tossindo, mas mesmo assim não fica doente? E por que, em outras situações, basta um leve contato para você pegar uma gripe avassaladora?
Já que o Nobel 2023 foi para cientistas que ajudaram na vacina do COVID-19, vamos mais fundo no assunto de doenças infecciosas, o que serve tanto para as virais quanto para as bacterianas.
Essa coisa de doença, mesmo a COVID, não é igual para todo mundo. Vamos entender melhor como é a jornada de um patógeno corpo humano!
O conceito de “dose infecciosa” é chave para entender essa dinâmica de ficar ou não doente. O que quer dizer que nem sempre estar exposto a um vírus ou bactéria significa que você vai, de fato, ficar doente, porque existem várias barreiras naturais que o nosso corpo construiu ao longo da evolução: a pele, o muco, pequenos “cílios” que protegem nossas vias respiratórias, e até nosso ácido estomacal.
Agora, imagine que um patógeno, seja ele vírus ou bactéria, é como um invasor tentando entrar numa fortaleza, e ele precisa passar por todas essas barreiras, achar um lugar aconchegante para se reproduzir e, ainda por cima, desviar dos ataques do nosso sistema imunológico, que está sempre pronto para combater os intrusos. (É aquela história dos nossos soldadinhos que contavam pra gente quando éramos pequenos!)
Curiosamente, estamos constantemente em contato com esses micro-organismos, mas, na maioria das vezes, eles não são numerosos o suficiente para superar nossas defesas. E olha que interessante: algumas vezes, esse contato pode não ser tão ruim para nossa saúde, essa pequena exposição pode até dar um “toque” no nosso sistema imunológico, fazendo com que ele fique ainda mais alerta e pronto para combater ameaças futuras.
A parte complicada começa quando esses invasores conseguem ultrapassar nossas linhas de defesa em grande número e começar a se reproduzir. Aí o bicho pode pegar pro nosso lado. Geralmente, quanto mais invasores temos em nosso corpo, maiores são as chances de nos sentirmos mal.
Vamos às 10 perguntas respondidas para dar uma clareza sobre as doenças infecciosas, incluindo a COVID-19.
- Quantos micróbios são necessários para que uma doença se desenvolva?
É variável, e a esse número damos o nome de “dose infecciosa” do patógeno. Um exemplo: Você já ouviu falar do norovírus?
O norovírus é um grupo de vírus que causa inflamação no estômago e intestinos, levando a sintomas como diarreia, vômito, náusea e dor no estômago. Frequentemente referido como “gastroenterite viral” ou a tão famosa “virose“.
Esse intruso é tão astuto que, em alguns casos, apenas 18 deles já são o suficiente para iniciar uma infecção. Ele é particularmente famoso em ambientes como cruzeiros, onde pessoas estão em contato próximo. Ele pode sobreviver fora do corpo humano, tornando possível que alguém contaminado deixe por aí “lembrancinhas” capazes de infectar outras pessoas dias depois.
- O que é o conceito de “carga viral”? Está relacionado ao conceito de dose infecciosa?
São ideias similares, mas enquanto a dose infecciosa se refere à quantidade de organismos necessários para levar a uma infecção, a carga viral é uma medida ativa da infecção: a quantidade de organismos que estão se replicando no hospedeiro. Esse termo foi popularizado com a compreensão do HIV/AIDS e aumentou o uso após o início da pandemia da Covid.
- Como os pesquisadores determinam a dose infecciosa de um micróbio?
Ainda é uma ciência imprecisa. O estudo “padrão-ouro”, chamado estudo de desafio humano, envolve dar deliberadamente uma dose do patógeno às pessoas, – o que é eticamente difícil. Pesquisadores, então, usam animais como cobaias, ratos, camundongos ou furões. A rota da infecção também importa, assim como estudos observacionais, que muitas vezes são imprecisos
- Por que as doses infecciosas de alguns patógenos são mais altas ou mais baixas do que outras?
Não se sabe ao certo. Esse aspecto pode se relacionar ao modo de operação do invasor. Patógenos que exigem contato direto com células hospedeiras tendem a ser mais eficazes, portanto, suas doses infecciosas são mais baixas. No entanto, essa ideia precisa de mais confirmação.
- O que sabemos sobre a dose infecciosa do vírus que causa a Covid?
Aprendemos muito nos quase quatro anos desde sua primeira aparição, baseados em modelos animais de infecção e estudos observacionais em humanos. A maioria dos modelos animais requer uma alta dose do vírus, enquanto em humanos, a dose infecciosa pode ser em torno de 100 a 400 PFU (“Plaque-Forming Units“. Em português, “Unidades Formadoras de Placa”), embora seja só uma estimativa aproximada.
PFU é uma medida para quantificar a quantidade de partículas virais capazes de formar placas (ou colônias) em culturas de células. Essas placas são áreas onde as células foram mortas ou danificadas pelo vírus. Ao contar o número de placas, os pesquisadores podem determinar a quantidade de vírus infecciosos em uma amostra.
No caso do Covid, o vírus é facilmente transmissível devido à sua baixa dose infecciosa. Comparando a dose infecciosa com a quantidade de vírus exalada por uma pessoa infectada, não é surpreendente que o vírus se espalhe rapidamente.
- As vacinas aumentam a dose infecciosa?
Sim. Quando alguém encontra um patógeno pela segunda vez (devido a uma doença anterior ou vacinação), várias defesas do hospedeiro são ativadas, como anticorpos que interferem na capacidade do micróbio de se anexar a uma célula hospedeira. Isso efetivamente aumenta a dose infecciosa.
- Como esse conhecimento pode nos ajudar a evitar doenças?
A exposição é uma função da concentração do patógeno e do tempo de contato. Reduzindo qualquer um desses fatores, é possível evitar doenças infecciosas.
- Por que especialistas recomendam um modelo de proteção em camadas desde o início da pandemia da Covid?
A ideia é que múltiplas barreiras, como distanciamento social, uso de máscaras e ventilação adequada, reduzem a exposição ao vírus e, consequentemente, o risco de infecção.
- De que forma a vacinação ajuda na prevenção da Covid?
A vacinação reduz o risco de infecção ao aumentar a dose infecciosa necessária para iniciar uma infecção e diminui as chances de desenvolver uma doença grave. Estudos também sugerem que pessoas vacinadas tendem a excretar menos partículas virais.
- Quais são os pilares de proteção contra infecções?
Uso de máscaras, ventilação aprimorada, distanciamento são fundamentais porque diminuem a quantidade de micróbios à qual ficamos expostos, e a vacinação aumenta a dose infecciosa.
Prevenção contra COVID-19 e outras doenças
Com base no entendimento sobre dose infecciosa, fica evidente que possuímos diversas ferramentas em nosso arsenal para combater e evitar doenças infecciosas, incluindo a Covid.
A combinação de barreiras físicas, como máscaras e distanciamento social, juntamente com medidas biológicas, como vacinação, proporciona uma defesa robusta contra patógenos. Assim, mesmo em meio à complexidade das dinâmicas de transmissão de doenças, as ações que podemos adotar são surpreendentemente diretas e eficazes.
Conhecimento sobre como as doenças se manifestam em nossos organismos aliado à adoção de medidas preventivas, podemos navegar com mais segurança nestes tempos incertos e proteger não apenas a nós mesmos, mas também nossa comunidade.
Fonte: Quanta Magazine