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Elétrons rebeldes? Novo comportamento das partículas chama atenção de cientistas

Imagine, por um momento, um cenário onde os elétrons, essas partículas subatômicas que orbitam o núcleo dos átomos, começam a se comportar de maneira totalmente inesperada, desafiando o que sabíamos sobre suas propriedades fundamentais. Esta é uma realidade observada por pesquisadores da Universidade de Washington, em Seattle, e posteriormente, em um experimento paralelo no Massachusetts Institute of Technology (MIT), em Cambridge, gerando entusiasmo entre físicos e teóricos.

Tradicionalmente, conhecemos os elétrons como as partículas que circulam ao redor do núcleo de um átomo, carregando uma carga elétrica negativa. No entanto, em certas condições extremas, esses elétrons podem começar a agir de maneira que desafia nossa compreensão usual.

Em maio do último ano, a equipe de físicos da Universidade de Washington fez uma observação peculiar ao conduzir uma corrente elétrica através de duas camadas atômicas de ditelureto de molibdênio (MoTe2), notando que os elétrons começaram a agir em uníssono, exibindo propriedades similares às de partículas com cargas fracionárias. Em vez de se comportarem com a carga usual de –1, os elétrons mostravam-se como se possuíssem cargas de –2/3 ou –3/5, uma peculiaridade intrigante, especialmente porque tal comportamento emergiu das propriedades inerentes do material, sem a necessidade de um campo magnético externo.

Não muito depois, um fenômeno comparável foi testemunhado em um material totalmente distinto. Uma equipe liderada por Long Ju, físico de matéria condensada do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em Cambridge, observou o efeito ao intercalar cinco camadas de grafeno entre folhas de nitreto de boro. Essa descoberta, publicada em fevereiro deste ano, marcou apenas a segunda ocorrência conhecida do efeito quântico anômalo Hall fracionário (FQAHE, do inglês fractional quantum Hall effect) em materiais bidimensionais, colocando a pesquisa sobre comportamento eletrônico em um território praticamente inexplorado.

A revelação foi suficiente para capturar a imaginação de físicos pelo mundo todo, especialmente durante o encontro de março da American Physical Society, em Minneapolis, Minnesota. Apesar de o mecanismo exato por trás do FQAHE em grafeno empilhado permanecer um mistério, o consenso geral é de que estamos à beira de desvendar novas e fundamentais verdades sobre o comportamento dos elétrons.

Além do fascínio teórico, as implicações práticas dessas descobertas não podem ser subestimadas. Partículas com cargas fracionárias são um componente chave para um tipo específico de computador quântico, prometendo revoluções tanto na tecnologia quanto na compreensão científica.

Estamos nos deparamos com a complexidade dos elétrons e seus efeitos quânticos que desafiam a compreensão tradicional. A resistência elétrica quantizada, um conceito que pode soar abstrato à primeira vista, revela nuances da interação dos elétrons surpreendentes à medida que os físicos utilizam temperaturas próximas ao zero absoluto, o que pode extrapolar a fronteira onde a física clássica se encontra com o estranho mundo quântico.

A manifestação do efeito Hall quântico, onde a resistência transversal adota “degraus” em múltiplos inteiros da carga do elétron, é apenas o começo desta saga. Imagine a autoestrada mais eficiente que se possa pensar, onde, independentemente do número de carros (ou neste caso, elétrons), todos se movem a uma velocidade constante, sem engarrafamentos. Este fenômeno, tão contraintuitivo quanto fascinante, demonstra a singularidade do comportamento eletrônico sob condições extremas.

A história fica ainda mais intrigante com o efeito Hall quântico fracionário (FQHE). Aqui, os elétrons, sob a influência de campos magnéticos fortes, começam a se comportar como se possuíssem apenas uma fração da sua carga habitual. Este comportamento coletivo, onde os elétrons perdem sua individualidade para atuar como partículas fracionárias, desvenda um “novo mundo” de possibilidades e complexidades na física teórica, como destacado por Ashvin Vishwanath, físico teórico da Universidade de Harvard.

Mas o que aconteceria se retirássemos o campo magnético externo dessa equação? Essa pergunta levou ao descobrimento do efeito Hall quântico anômalo. Observado em finas películas ferromagnéticas sem a aplicação de um campo magnético externo, esse fenômeno “anômalo” desafia nossa compreensão prévia, abrindo portas para um novo entendimento dos mistérios quânticos.

Agora nos deparamos com uma inovação notável vinda da equipe da Universidade de Washington. Eles apresentaram ao mundo científico a observação do Efeito Hall Quântico Anômalo Fracionário (FQAHE) em um material 2D meticulosamente projetado, composto por duas folhas de MoTe2 justapostas com uma leve torção, desafiando a compreensão convencional dos elétrons e seu comportamento coletivo, e introduzindo o conceito intrigante de materiais moiré.

Materiais moiré, com suas camadas atômicas finas entrelaçadas e torcidas, agem sob a premissa de alterar o cenário potencial elétrico de forma tão significativa que imitam o efeito de um campo magnético poderoso. Esta manipulação criativa do arranjo atômico permite a observação de fenômenos quânticos sem a necessidade de campos magnéticos externos, um passo revolucionário que nos aproxima de entender a dança complexa dos elétrons em sistemas quânticos.

Um novo capítulo da investigação de elétrons?

A saga para desvendar o FQAHE em MoTe2 não foi isenta de desafios. A equipe inicialmente perseguiu a ideia de um efeito em um ângulo de torção de 1.4º, em uma jornada de um ano que se provou infrutífera. Foi apenas ao ajustar o ângulo para cerca de 4º que os sinais do efeito cobiçado começaram a se revelar, ilustrando a fina sintonia necessária para capturar esses comportamentos quânticos esquivos.

Paralelamente, no MIT, Long Ju e sua equipe estavam refinando suas próprias técnicas com grafeno, um material já conhecido por seus padrões hexagonais perfeitos. Imprensando grafeno entre duas camadas de nitreto de boro, uma nova configuração moiré emergiu, revelando os mesmos platôs característicos do FQAHE observados pela equipe de Washington. Este sucesso não apenas validou a descoberta anterior, mas também destacou o grafeno como um segundo sistema a exibir tal fenômeno, expandindo nosso repertório de materiais quânticos anômalos.

Cada sistema moiré, seja MoTe2 ou grafeno, apresenta suas peculiaridades, desde a temperatura operacional até a qualidade do material. Enquanto o MoTe2 exibiu o FQAHE em temperaturas um pouco acima do zero absoluto, o sistema de grafeno exigiu condições ainda mais frias, aproximando-se dos 0.1 Kelvin. Apesar dessas diferenças, o grafeno se destaca como um material de maior pureza e mais fácil de medir, oferecendo um campo promissor para futuras investigações.

Diferentemente dos resultados mais previsíveis observados no MoTe2, o grafeno em camadas, com sua estrutura moiré, representou um enigma que ainda confunde os teóricos. Essa divergência entre o esperado e o observado lança o desafio de buscar entender como, exatamente, esse efeito se manifesta em um sistema aparentemente desfavorável às previsões teóricas existentes.

O cerne dessa confusão gira em torno do papel do padrão moiré no FQAHE. A atividade predominante dos elétrons na camada superior do grafeno, distante da suposta influência crítica do padrão moiré entre o grafeno e o nitreto de boro, sugere que talvez estejamos olhando para o fenômeno sob uma lente equivocada. A teoria, como sempre, busca alcançar a prática, mas a complexidade deste sistema específico desafia suposições antes consideradas sólidas.

Entretanto, mesmo diante dessa incerteza, não faltam vozes que ecoam tanto cautela quanto entusiasmo, respectivamente pela necessidade de verificação empírica das suposições que sustentam as teorias emergentes e, por outro lado, pelo surgimento da perspectiva de que ainda há mistérios quânticos a serem desvendados, que o grafeno em camadas não é apenas um ponto fora da curva, mas um convite para explorar os limites do que entendemos sobre o comportamento quântico.

Para os teóricos como Ashvin Vishwanath e B. Andrei Bernevig, essa fase de incerteza não é um impasse, mas sim um campo fértil para a inovação científica. A possibilidade de que o padrão moiré no grafeno desempenhe um papel, embora menos crucial do que no MoTe2, abre novos caminhos de investigação. Talvez o que estejamos presenciando seja uma redefinição das regras que governam o comportamento dos elétrons em materiais quânticos.

Fonte: Nature

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