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Ignorância intencional: Estudo aponta por que escolhemos não saber das coisas

Por que escolher a ignorância? Em mundo cada vez mais interconectado e informado, a decisão de ignorar informações relevantes sobre as consequências de nossas ações torna-se um fenômeno intrigante.

Este comportamento, conhecido como ignorância intencional, contrasta fortemente com o altruísmo, onde indivíduos buscam entender e agir em consideração ao impacto de suas ações nos outros. Explorando essa dicotomia, mergulhamos na complexa relação entre conhecimento, escolha e moralidade.

A história de Ebenezer Scrooge, no clássico “Um Conto de Natal” de Charles Dickens, serve como um exemplo perfeito. Scrooge, inicialmente um avarento egoísta, transforma-se em um benfeitor generoso após uma série de revelações sobre como suas ações afetam os outros. Esta mudança dramática, desencadeada pelo conhecimento, levanta uma questão fundamental: as pessoas realmente desejam saber como suas ações afetam os outros?

A generosidade tem suas recompensas, mas frequentemente exige sacrifícios de tempo, dinheiro, esforço e conforto. Isso pode explicar por que a ignorância intencional é tão comum. Ela permite que as pessoas ajam de maneira egoísta sem o peso da culpa. Ainda que existam evidências científicas abundantes sobre temas como as mudanças climáticas, muitos evitam se engajar com os fatos, e o mesmo se aplica ao desconhecimento sobre as condições de vida dos animais de fazenda ou a origem ética dos produtos consumidos.

Para entender melhor a prevalência e as razões por trás da ignorância intencional, pesquisadores da área comportamental analisaram dados de mais de 6.000 pessoas em múltiplos estudos. Descobriram que 40% das pessoas optam por “não saber” as consequências de suas ações para maximizar seus ganhos e minimizar a culpa. Em contrapartida, aproximadamente 40% dos participantes demonstraram ser altruístas, buscando ativamente informações sobre as consequências de suas ações para beneficiar os outros.

Os estudos analisados basearam-se em 22 pesquisas prévias sobre ignorância intencional. Os experimentos, em sua maioria, colocavam os participantes em pares, agindo anonimamente, e pediam que fizessem escolhas que afetavam seus ganhos e os de seus parceiros. Estas decisões eram feitas em dois contextos: um transparente, onde as consequências das escolhas eram claras, e outro ambíguo, onde o impacto nas outras partes não era inicialmente conhecido, mas poderia ser revelado mediante solicitação.

Por exemplo, em alguns estudos, os participantes tinham que escolher entre receber 5 ou 6 dólares. No cenário transparente, ao escolher 5, sabiam que seu parceiro também receberia 5, mas se escolhessem 6, o parceiro receberia apenas 1. No cenário ambíguo, a distribuição de ganhos variava, e os participantes podiam escolher se queriam ou não saber como sua escolha afetaria o outro.

De maneira reveladora, nos estudos observou-se que, no cenário transparente, a maioria, 55%, optou pela alternativa altruísta, compartilhando os ganhos de maneira igualitária. No entanto, no cenário ambíguo, 40% escolheram permanecer na ignorância, permitindo-se agir de forma egoísta. Entre aqueles que buscaram informações adicionais, 36% ainda assim optaram por manter uma maior parcela dos ganhos, em detrimento de seus parceiros.

Esse fenômeno sugere uma inclinação para o egoísmo quando os indivíduos têm a opção de evitar informações. Apenas 39% das pessoas no cenário ambíguo fizeram escolhas que beneficiaram seu parceiro, um declínio significativo em comparação com o cenário transparente. Isso leva à reflexão: a ignorância no cenário ambíguo é realmente voluntária? 

Por que optamos pela ignorância?

Para explorar essa questão, os pesquisadores realizaram uma segunda análise focada nas motivações para buscar informações, descobrindo que as pessoas que optaram por receber informações no cenário ambíguo eram mais propensas a fazer escolhas altruístas do que aquelas no cenário transparente, indicando que a busca por informações é, pelo menos em parte, motivada pelo desejo de agir corretamente. Por outro lado, optar pela ignorância serve como uma desculpa para agir egoisticamente.

Nossos comportamentos altruístas podem ser impulsionados pela pressão de agir conforme o esperado quando as consequências de nossas escolhas são claras. No entanto, quando temos a oportunidade de ignorar as consequências de nossas ações, a tendência é optar pela ignorância, protegendo as pessoas de saberem como suas ações prejudicam os outros, permitindo que se sintam menos culpadas.

Diante desses resultados, surgem estratégias para combater a ignorância intencional. Nas pesquisas analisadas, a tomada de decisão ocorreu dentro de uma moldura moral: era possível beneficiar-se às custas do parceiro. Esta apresentação é um terreno fértil para a ignorância intencional, pois ameaça a autoimagem da pessoa, aumentando a sensação de que, ao saber o que realmente está acontecendo, terá que fazer escolhas mais difíceis para ser uma boa pessoa.

Se pudermos evitar enfatizar demais o aspecto moral das decisões, talvez as pessoas se sintam menos ameaçadas e, consequentemente, menos inclinadas à ignorância intencional.

Outras pesquisas sugerem maneiras promissoras de fazer isso, como apresentar opções éticas de forma destacada, tornar menus vegetarianos a opção padrão, permitindo que as pessoas optem ou não por carne, como parte de um esforço para incentivar escolhas alimentares sustentáveis. Ou poderíamos incentivar as pessoas a pensar mais positivamente sobre boas ações, em vez de culpá-las pelo que não fizeram. Ressaltar conquistas globais recentes, como a recuperação da camada de ozônio, por exemplo, pode incentivar as pessoas a continuar o bom trabalho em vez de sentir que a batalha está perdida e que tudo é desolador.

Embora não tenhamos fantasmas à moda de Dickens para nos guiar, ainda existem passos que podemos tomar para incentivar o altruísmo e a generosidade em nós mesmos e nos outros, afastando a ignorância intencional. A conscientização sobre nossas inclinações naturais e a forma como estruturamos nossas escolhas podem ser a chave para promover uma sociedade mais consciente.

Fonte: Scientific American

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