Nossa linguagem é uma das coisas mais fascinantes, e ainda mais impressionante é que cada um de nós carrega dentro de si um dicionário muito mais complexo e fascinante: o dicionário mental. Nosso cérebro armazena e recupera palavras, e isso é bastante intrigante da perspectiva da linguagem e cognição.
Imagine que cada palavra que você conhece está armazenada em um vasto arquivo em sua mente, chamado de dicionário mental, contendo informações sobre as letras, sons, significados e até a gramática das palavras, funcionando também como um dicionário de sinônimos ajudando a conectar palavras por similaridades de significado, som ou grafia. Embora nossa linguagem nos aproxime muito, curiosamente, cada pessoa possui seu próprio dicionário mental, único e moldado por experiências de vida, educação, cultura e ocupação.
A personalização do dicionário mental é tão profunda que até mesmo pessoas que falam o mesmo idioma possuem conjuntos de palavras distintos. Estudos indicam que um falante médio de inglês americano de 20 anos conhece cerca de 42.000 palavras únicas, número que pode crescer para aproximadamente 48.000 até os 60 anos. Esse crescimento vocabular varia de pessoa para pessoa, refletindo a riqueza e diversidade das experiências humanas.
Nossa linguagem é fundamental para nossas relações sociais. Mas e se os cérebros dos morcegos nos ajudar a entender mais sobre isso, mesmo sem linguagem? Clica aqui para ler mais sobre o assunto!
Mas como será que esse dicionário mental está organizado? Ao contrário de um dicionário físico, não está em ordem alfabética, e teorias como a “teoria da célula avó”, que sugere que cada conceito é codificado por um único neurônio, são amplamente rejeitadas. Por outro lado, um aspecto da teoria da célula avó merece ser considerado: que para alguns tipos de informação, algumas partes do cérebro são mais importantes do que outras.
Contudo, em vez de termos um neurônio para cada conceito, acredita-se que grandes redes de neurônios espalhados pelo cérebro trabalham juntos para trazer à tona o conhecimento das palavras. Por exemplo, quando pensamos na palavra “cachorro”, nosso cérebro acessa diferentes aspectos relacionados a ela, como cheiro, som e memórias emocionais, processados em diversas partes.
Linguagem: usando nosso dicionário mental
Uma característica impressionante do nosso dicionário mental é sua capacidade de acesso rápido e dinâmico. Quando falamos, nossos cérebros conseguem recuperar palavras com uma velocidade incrível. Em um estudo, observou-se que estudantes universitários selecionaram palavras em apenas 200 milissegundos após ver uma imagem. Esse processo rápido é essencial em nossa linguagem, nos permitindo manter conversas fluídas e coerentes, demonstrando a eficiência surpreendente do cérebro humano na linguagem.
Claro, nem sempre esse processo é perfeito. Quem nunca experimentou o fenômeno do “na ponta da língua“, aquele momento frustrante em que sabemos exatamente o que queremos dizer, mas não conseguimos encontrar a palavra certa? Podemos até saber detalhes específicos do que queremos dizer, como primeira letra, som ou sinônimo, mas não conseguimos recuperar a palavra. Essa experiência é comum na linguagem humana e tende a aumentar com a idade, possivelmente devido a uma desaceleração na habilidade de ativar os sons corretos para a palavra desejada.
Para algumas pessoas, especialmente aquelas com afasia – um distúrbio de linguagem frequentemente resultante de lesões cerebrais ou neurodegeneração – a dificuldade na recuperação de palavras pode ser bastante debilitante.
Felizmente, existem tratamentos para melhorar a habilidade de recuperação de palavras, como a análise de características semânticas, que busca fortalecer as relações semânticas entre palavras, e também a terapia fonológica, que fortalece a seleção e produção dos sons da nossa linguagem que são necessários para a produção de palavras. Além disso, aplicativos modernos fornecem terapia de recuperação de palavras remotamente, facilitando o acesso ao tratamento.
Ao refletir sobre as palavras que escolhemos em nossas conversas, nos deparamos com a singularidade de nossa voz e personalidade. As palavras que usamos, e a maneira como nosso cérebro as organiza e recupera, são parte integral da nossa linguagem, – algo que nos torna únicos.
Este dicionário mental que cada um de nós carrega é mais do que uma coleção de palavras, é um reflexo de nossa história de vida, de nossas experiências e de nosso constante aprendizado, evoluindo e se adaptando ao longo de nossas vidas, tornando-se parte vital de nossa identidade.
Cada palavra escolhida, cada frase formada, é uma demonstração da incrível capacidade do cérebro humano de armazenar, organizar e recuperar a vasta biblioteca de palavras que é o nosso dicionário mental. Isso nos faz não apenas apreciar e refletir sobre a linguagem, mas também oferecer uma nova perspectiva sobre a complexidade e beleza da comunicação humana.
Fonte: Scientific American