No dia 24, após uma extensa jornada pelo espaço, uma cápsula em formato de disco pousou no deserto de Utah. O que ela carregava não era apenas pedaços de rocha e pó, mas sim um tesouro sem precedentes: amostras diretas do asteroide Bennu. É uma ocasião histórica, já que é a primeira vez que a NASA conseguiu trazer de volta à Terra fragmentos deste tipo de objeto celestial.
Nos próximos dias, estas partículas serão transportadas para o Johnson Space Center, em Houston, Texas. Especialistas vão desmontar com cuidado o compartimento e mergulhar no estudo detalhado da composição e mineralogia dessas amostras imaculadas. A grande questão é: Será que elas poderão nos oferecer pistas sobre as origens do nosso Sistema Solar?
A emoção na comunidade científica é palpável. Michelle Thompson, cientista planetária da Universidade de Purdue, expressou seu entusiasmo ao mencionar que se sente como “uma criança na véspera de Natal, ansiosa demais para dormir“.
Pra falar a verdade… quem não está ansioso com essa novidade vinda do espaço, né? Podemos estar próximos de entender melhor a história cósmica que nos rodeia.
A exploração do espaço em busca de respostas
A missão OSIRIS-REx é um projeto colossal, orçado em US$ 1,2 bilhão, e não foi apenas uma viagem ao espaço, foi uma busca por respostas sobre o nosso passado cósmico.
Lançada em 2016, a OSIRIS-REx levou dois anos após sua chegada em 2018 para estudar detalhadamente o asteroide Bennu, uma relíquia escura e com formato de diamante que flutua no espaço, mas o ápice de sua missão ocorreu quando, usando um braço robótico, lançou sobre a superfície do asteroide um sopro de gás e coletou poeira e rochas que levantou.
Foi coletado muito material e devido a pedras maiores que se alojaram no mecanismo de coleta, algumas amostras de rochas menores se perderam. Dante Lauretta, o principal investigador da missão na Universidade do Arizona em Tucson, admitiu que foi de partir o coração ver essas amostras escaparem.
Ainda assim, os obstáculos não ofuscaram o sucesso da missão. A espaçonave conseguiu trazer para casa impressionantes 250 gramas de rochas e terra, um feito bastante considerável. Para dar uma ideia do quanto foi importante, basta comparar com o que a Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial (JAXA) coletou anteriormente, que foi menos de um miligrama do asteroide Itokawa em 2005 e 5,4 gramas do asteroide Ryugu em 2019.
Para garantir a integridade das amostras vindas do espaço, a equipe da NASA planejou colocá-las em uma atmosfera de nitrogênio puro logo após a aterrissagem, para reduzir o risco de contaminação. Esse procedimento meticuloso permitirá que os cientistas estudem a geologia e a química do asteroide, preservando sua origem que remonta à formação do Sistema Solar há mais de 4,5 bilhões de anos.
Nicole Lunning, curadora-chefe de amostras da missão no Centro Espacial Johnson, ressaltou a singularidade desse material primitivo do espaço é que, diferente de outros meteoritos conhecidos, não foi alterado ao passar pela atmosfera terrestre e continuará protegido.
Carbono em Bennu
O asteroide Bennu é enriquecido com carbono, o que significa que as amostras coletadas podem ter uma semelhança surpreendente com os meteoritos ricos em carbono que já chegaram à Terra. Isso desperta a fascinação não apenas por sua origem, mas também pelo que ele pode nos revelar sobre a vida além de nosso planeta.
O fascinante nessas amostras vindas do espaço é que é muito provável que elas abriguem compostos orgânicos. Estas são as moléculas à base de carbono encontradas em muitos meteoritos, e são elas que formam a base de muitos tipos de química, inclusive aquelas que podem dar origem à vida.
Daniel Glavin, cientista sênior de recolha de amostras no Goddard Space Flight Center da NASA em Greenbelt, Maryland está focado nas nucleobases, componentes centrais do código genético que compõem o DNA e o RNA. Já foram encontrados esses compostos em meteoritos anteriormente, mas nunca tão imaculados quanto esperamos das amostras de Bennu. Glavin enfatiza a pureza das amostras, indicando que os resultados obtidos delas serão inestimáveis e fidedignos.
Nos próximos dias e semanas, uma atividade intensa ocorrerá nos laboratórios da NASA. Curadores começarão o processo meticuloso de desempacotar e estudar o pó e os seixos contidos no recipiente de armazenamento da OSIRIS-REx. Usando caixas de luvas preenchidas com nitrogênio, eles examinarão as amostras, determinando os tipos de rochas presentes e registrando detalhes como cor, volume e porosidade. Uma equipe especial terá o privilégio de analisar até 100 miligramas das amostras nas primeiras 72 horas, e após esse período inicial, voltarão sua atenção para os grãos recolhidos pelos 24 pads de contato de aço inoxidável, os primeiros a tocar a superfície de Bennu.
Também é possível que os cientistas façam experimentos para comparar o material da superfície de Bennu com o que foi coletado das camadas mais profundas. Para dar uma ideia da extensão dessa coleta: o braço robótico da OSIRIS-REx pode ter se aprofundado até 40 centímetros abaixo da superfície irregular de Bennu durante sua operação.
O futuro da missão OSIRIS-REx e seu destino no espaço
Enquanto nos preparamos para o aguardado comunicado de 11 de outubro, no qual a NASA revelará os primeiros resultados científicos sobre essas rochas vindas do espaço, uma nuvem de incerteza paira no ar, com rumores de que o governo dos EUA poderia interromper, ao menos temporariamente, os trabalhos da agência em 1 de outubro . As divergências no Congresso, com republicanos e democratas em lados opostos sobre as prioridades de financiamento para 2024 têm potencial para afetar diversas agências federais, incluindo a NASA.
Lori Glaze, líder da divisão de ciências planetárias da NASA, nos tranquiliza ao afirmar que, embora algumas etapas da análise possam sofrer atrasos, a amostra permanecerá protegida. Glaze destaca que a amostra esperou por mais de 4 bilhões de anos para ser estudada por nós, um pequeno atraso adicional é um inconveniente mínimo.
A distribuição futura dessas amostras também já foi planejada. Cerca de 70% do material coletado de Bennu será disponibilizado para cientistas fora da NASA e para futuras gerações de pesquisadores. Como um gesto de colaboração internacional, 4% da amostra será destinado à Agência Espacial Canadense, que ajudou na missão para o espaço com a construção de um instrumento a laser a bordo da OSIRIS-REx, e 0,5% será entregue à JAXA, permitindo uma comparação interessante entre os asteroides Bennu e Ryugu.
E, falando sobre o futuro, a espaçonave OSIRIS-REx tem novos horizontes a explorar no espaço. Após completar com sucesso sua missão com Bennu, ela já se direciona ao asteroide Apophis, um corpo celeste com uma composição química ‘pedregosa’, que promete mais descobertas, especialmente considerando sua proximidade dramática com a Terra em 2029.
A missão OSIRIS-REx não é apenas uma realização científica notável, mas também um testemunho da perseverança, colaboração e curiosidade humanas na exploração do espaço e mesmo que esses estudos sofram atrasos, estamos mais perto de saber sobre grandes mistérios da Terra!
Fonte: Nature