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O tempo na física: Relatividade, dilatação e buracos negros

O que é o tempo? Tá aí uma coisa que a gente diz que sabe o que é, que a gente consegue medir e tal, mas… na hora de definir parece que faltam as palavras. Vai ver é porque somos como prisioneiros do tempo, que flui somente num sentido, do presente para o futuro… Somos feitos de tempo e de espaço.

Podemos definir o tempo como uma sucessão de acontecimentos a partir das relações de causa e efeito. Assim como não dá para “desfritar” um ovo, não se pode voltar no tempo e alterar o que aconteceu. É a segunda lei da termodinâmica que nos garante isso. Essa lei dá sentido à vida, ela afirma que a entropia, ou seja, a desordem, a irreversibilidade dos fenômenos de conversão e dissipação de energia aumentará continuamente. 

A física basicamente define o tempo como aquilo que permite ao universo se modificar, desde a sua origem.  É o fluxo, o movimento, a maneira que o então se transforma em agora. E o agora já vira o então de outro agora… E se a vida é uma sucessão de encontros inéditos com o mundo, é o tempo que flui lentamente quem dita essas regras.

Tá bom. Mas o assunto não é tão simples nem para a física

Por que o tempo é relativo?

No dia 30 de junho de 1905, o físico alemão Albert Einstein publicou o artigo sobre a teoria da relatividade restrita. Na época, a velocidade da luz já tinha sido medida: cerca de 300 mil quilômetros por segundo! A grande descoberta, postulada por Einstein é que essa velocidade é sempre a mesma, independente do referencial. 

“Mas… Como assim?“, – você pode estar se perguntando.

Olha só: Imagine você dentro de um carro a 100 km/h e à sua frente tem outro carro com uma outra velocidade, suponhamos que de 150 km/h. A velocidade do carro da frente em relação a você será de… 50 km/h a mais, certo?

Mas isso não acontece com a luz. Ela sempre será medida como 300 mil km/s não importando se quem mede está em movimento ou parado. Então para que a velocidade da luz seja sempre constante, independente de quem está medindo, duas coisas precisam acontecer na natureza: Ou o espaço se contrair, ou o tempo tem que se dilatar. 

Então é assim ó:

Velocidade é distância percorrida dividida pelo tempo que se leva para percorrer essa distância, e para que a velocidade da luz permaneça a mesma em qualquer referencial, as distâncias, o espaço se contraem e a passagem do tempo aumenta, se dilata!

Por isso que para um objeto que está viajando com uma velocidade muito próxima à da luz, o tempo passa mais devagar em relação a quem está em repouso. 

E é importante dizer que isso, que um dia já foi só teoria, hoje já é comprovado!

Tempo x velocidade

Já que a velocidade da luz é absoluta e constante, e vimos que alguém que pudesse viajar a uma velocidade próxima à da luz ainda registraria um feixe de luz se aproximando com a velocidade da luz esperada, do mesmo jeito que alguém em repouso mediria.

Logo, observadores em movimento relativo um ao outro experimentam então o espaço e o tempo de modo diferente. De modo simplificado é assim: Quanto mais rápido um referencial viaja pelo espaço em relação a você, mais devagar você observa o tempo dele passar.

Antes, Newton pensava que o tempo era absoluto, fluindo independente de qualquer outra coisa, no mesmo ritmo, em qualquer lugar do Universo em que fosse medido. Dez minutos, para um observador, é o mesmo que dez minutos para outro, mesmo que um esteja parado e o outro disparado numa espaçonave mais veloz possível!

Com a descoberta assombrosa de que a velocidade da luz é sempre a mesma, essa sim absoluta, e que como consequência espaço e tempo é que tem valores relativos, nosso entendimento da realidade se modificou de maneira profunda!

Então quanto mais rápido um corpo viaja pelo espaço, mais devagar anda no tempo. Essa “dilatação do tempo” é levada em conta por exemplo na interpretação dos resultados obtidos no Grande Colisor de Hádrons do Cern, onde partículas são despedaçadas umas contra as outras a velocidades próximas à da luz!

Dilatação do tempo

Vamos agora falar um pouco mais sobre a dilatação temporal. “O paradoxo dos gêmeos”. Já ouviu falar?

Uma das consequências do fato da velocidade da luz ser sempre a mesma, não importando se quem mede está ou não em movimento, é a dilatação temporal, representada por essa equação aqui:

Onde:
•Delta T° é o Intervalo de Tempo do objeto sem movimento

•Delta T é o Intervalo de tempo do objeto com movimento

•V é Velocidade do Objeto em movimento

•C é a velocidade da luz

E pra ilustrar essa coisa estranha prevista lá na teoria da relatividade descoberta pelo Einstein, o físico Paul Langevin propôs um experimento mental chamado “Paradoxo dos Gêmeos“.

No “Paradoxo dos Gêmeos” ou “Paradoxo de Langevin”, o físico imagina dois gêmeos idênticos. Um deles faz uma viagem espacial em uma nave de alta velocidade (próxima à velocidade da luz), enquanto o outro permanece na Terra.

De acordo com a Teoria da Relatividade Especial de Einstein, o tempo passa mais lentamente para o gêmeo viajante em comparação com o gêmeo que ficou na Terra devido aos efeitos da dilatação do tempo.

Quando o gêmeo viajante retorna à Terra, ele descobre que menos tempo passou para ele em comparação com seu irmão que permaneceu no planeta. Assim, o gêmeo que viajou pelo espaço é mais jovem do que seu irmão gêmeo, apesar de terem nascido ao mesmo tempo.

Esse experimento mental desafia nossas noções comuns de tempo e envelhecimento, sugerindo que o tempo não é absoluto, mas sim relativo, e pode variar de acordo com a velocidade relativa entre observadores.

Mas… temos um problema!

A proposta do paradoxo não é válida, pois a Teoria da Relatividade só se aplica para referenciais inerciais, ou seja, que se movem com velocidade constante. Nesse caso, como o gêmeo astronauta poderia sair do repouso para atingir velocidades próximas à da luz sem aceleração? O corpo humano não é capaz de suportar acelerações muito altas. Há um limite de aceleração suportável (cerca de 50 m/s²), e esse limite tornaria o processo de aceleração e de desaceleração da nave espacial muito longo para o tempo de vida humano.

O princípio de equivalência indica que, se o gêmeo viajante estivesse movendo-se com uma velocidade constante, qualquer um dos gêmeos poderia alegar que era o outro gêmeo que se movia em relação a ele, não podendo haver assim uma diferenciação entre o gêmeo que ficou na Terra e o que partiu em viagem.

Portanto, apesar de parecer bastante convincente, o paradoxo dos gêmeos tem suas limitações. Mesmo assim, a dilatação temporal, prevista pela relatividade restrita, já foi constatada em diversos experimentos científicos envolvendo relógios atômicos e até mesmo partículas subatômicas.

A dilatação temporal é complexa. Imagine quando pensada em algo mais complexo ainda…

Dilatação temporal nos buracos negros

Um buraco negro é o objeto mais misterioso da natureza! É uma região onde o próprio espaço e tempo entram em colapso. Imagine o espaço como um tecido. É como se fosse uma ruptura nesse tecido!

E não temos a mínima ideia do que existe no interior de um buraco negro. Pertinho dele, tem uma região, uma “borda” que a gente chama de horizonte de eventos. Tudo o que passa desse limite não tem mais volta, nem a luz consegue escapar.

E mais, pertinho dessa região, a passagem do tempo quase para, em relação a quem observa de um outro lugar no Universo.

Um buraco negro é o resultado do colapso gravitacional de uma estrela que tenha pelo menos 3 vezes a massa do nosso Sol!

Toda estrela se mantém graças às reações de fusão nuclear no seu núcleo, o que gera uma força, uma pressão contrária que se contrabalancea a força da gravidade. Quando esse combustível nuclear termina, a gravidade vence, e a estrela colapsa. 

É pela teoria da relatividade geral que a gente estuda a formação e evolução dos buracos negros. Mas quando se trata de estudar seu interior, todas as tentativas parecem frustradas até agora.

O centro de um buraco negro é a singularidade, impossível de ser observada. Ela fica escondida pelo seu horizonte de eventos, é a última fronteira do nosso entendimento, onde a física que a gente conhece ainda não alcança: um lugar onde a matéria é comprimida até um ponto infinitamente pequeno, e todas as concepções de tempo e espaço se desfazem completamente. E realmente não existe. Algo tem que substituir a singularidade, mas não sabemos exatamente o quê.

Há muitas teorias, muito bem construídas e consistentes do ponto de vista matemático e físico, que tentam responder essa questão. E uma delas é a Gravidade Quântica em Loop.  A “estrela de Planck”, é uma possibilidade teórica imaginada pela gravidade quântica em loop, que é em si uma proposta altamente hipotética para criar uma versão quântica da gravidade.

No mundo da gravidade quântica em loop, o espaço e o tempo são quantizados – o universo ao nosso redor é composto de pequenos pedaços discretos, mas em uma escala tão incrivelmente pequena que nossos movimentos parecem suaves e contínuos, como os pixels que compõem a imagem numa tela de computador ou do seu smartphone.

Essa estrutura teórica do espaço-tempo oferece dois benefícios. Primeiro, leva o sonho da mecânica quântica à sua conclusão final, explicando a gravidade de uma maneira natural. E dois, torna impossível a formação de singularidades dentro de buracos negros.

À medida que a matéria é esmagada sob o imenso peso gravitacional de uma estrela em colapso, ela encontra resistência. A descrição do espaço-tempo impede que a matéria atinja algo menor que o comprimento de Planck (cerca de 1,68 vezes 10-35 metros). Todo o material que já caiu no buraco negro é comprimido em uma bola muito pequena, perfeitamente microscópica, mas definitivamente não infinitamente pequena.

Essa resistência à compressão contínua eventualmente força o material a não entrar em colapso (ou seja, explodir), tornando os buracos negros apenas objetos temporários. Mas por causa dos efeitos extremos de dilatação do tempo em torno dos buracos negros, da nossa perspectiva no universo exterior, são necessários bilhões, até trilhões, de anos antes de explodirem. 

Pois é… Parece que explicar o tempo e entender seus efeitos em diferentes contextos não é nada fácil. Nem para a física!

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Marcelo Lapola

Marcelo Lapola

Professor, pesquisador e físico na Unesp - Rio Claro; Doutor em cosmologia e astrofísica pelo ITA | Ciência, arte, e divulgação científica na veia! 🔭

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