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Por que células destroem seu próprio DNA? Entenda o que um verme pode nos dizer sobre o assunto 

O DNA é a “identidade” de uma célula. Então qual a razão de destruí-los? Se você alguma vez imaginou as células como pequenas fortalezas, defendendo seu território a qualquer custo, é mais ou menos isso que acontece mesmo! Enquanto estudava a reprodução de minúsculos vermes, Marie Delattre, bióloga celular da École Normale Supérieure em Lyon, esbarrou em algo que deixaria qualquer fã de séries de ficção científica boquiaberto.

Ao observar o embrião do nematoide Mesorhabditis belari, Delattre notou uma cena caótica: fragmentos de DNA estavam flutuando por todos os lados, dentro e fora dos núcleos das células. A primeira reação dela foi pensar que o embrião deu seu último suspiro, mas, para sua surpresa, o embrião estava mais vivo do que nunca, só estava fazendo algo que não esperávamos: destruindo parte do seu próprio DNA.

Outro verme foi estudado e nos deu informações sobre o nosso cérebro. Duvida? Então clica aqui pra ver!

Tradicionalmente, pensávamos que o DNA de um organismo era como um livro sagrado, passado de geração em geração sem perder uma única página, porém, esse pequeno verme estava, propositalmente, rasgando capítulos inteiros do seu “livro”. Esse ato radical é conhecido como eliminação programada de DNA, ou PDE na sigla em inglês (programmed DNA elimination).

Mas por que um organismo faria algo assim? Bem, parece que o PDE é uma forma das células eliminarem partes do DNA que não são úteis ou que até podem atrapalhá-las. Essa descoberta sugere que algumas espécies, como o M. belari, se livram de sequências indesejadas de DNA para manter sua saúde e eficiência.

A saga genética da renovação

Em 1887, bem antes de cientistas identificarem o DNA como a essência genética dos seres vivos, A PDE foi observada pela primeira vez, pelo um biólogo alemão, 

Theodor Boveri, que observou um fenômeno semelhante em um nematoide diferente, que parasita cavalos.  O extenso genoma deste nematóide passava por um processo onde se agrupava, se fragmentava e, posteriormente, se reorganizava em estruturas menores durante a mitose. As sequências que não foram reutilizadas eram simplesmente descartadas.

Durante todo o século 20, os cientistas encontraram esse mesmo fenômeno em um punhado de organismos como ciliados, mariposas e até mesmo bandicoots, mas o motivo para  esse “auto-corte” de DNA era um grande mistério.

Delattre decidiu olhar mais de perto o DNA do verme adulto, comparando o DNA reprodutivo com o DNA não-reprodutivo do verme, e percebeu que no não-reprodutivo estava, de fato, faltando pedaços enormes. Durante o crescimento do embrião, grandes sequências de DNA simplesmente sumiam.

Assistindo esses nematoides sob um microscópio, os cientistas observaram que os embriões quebravam 20 cromossomos em pequenos fragmentos e depois os reorganizavam em 40 cromossomos miniatura. A maior parte desses fragmentos se juntava novamente, mas uma parte considerável era descartada. Ao todo, o nematoide descartava um terço do seu DNA!

Delattre percebeu que o DNA excluído não era aleatório, eram principalmente sequências repetitivas que nem sequer codificavam genes, o que é como se fosse uma limpeza de coisas inúteis.

Esses trechos de sequências repetidas ou não codificantes são encontrados nas células eucarióticas, – que são as nossas. Estas células são unidades celulares caracterizadas por possuírem um núcleo delimitado por uma membrana (diferente de uma célula procariótica, que não tem um núcleo definido), onde está contido o material genético (DNA), apresentando uma organização interna complexa com diversas organelas membranosas, como mitocôndrias, retículo endoplasmático e aparelho de Golgi, que desempenham funções especializadas.

Algumas dessas sequências repetitivas, como o DNA satélite, são essenciais para empacotar o DNA e regular a expressão gênica. Por outro lado, existem as sequências repetitivas, especialmente os transposons, que não ajudam em nada e até atrapalham. Transposons são sequências de DNA que têm a capacidade de se mover e inserir em diferentes locais dentro do genoma de uma célula. São tipo “ladrões de DNA”, replicando-se milhares ou milhões de vezes, gastando energia e tempo da célula.

Mas embora pareçam vilões, os transposons podem também ser heróis que, ao se copiarem repetidamente, oferecem à célula material fresco que pode mudar e evoluir em novos genes. Jonathan Wells, geneticista evolucionista da Universidade Cornellda, até diz que esses elementos repetitivos são “o solo em que todos os outros genes estão assentados“, surpreendentemente sendo uma fonte rica de inovação genética.

Delattre, não está totalmente convencida de que tudo gira em torno dos transposons e se esse DNA parasitário é tão prejudicial, por que eliminá-lo apenas nas células somáticas (que não estão envolvidas na reprodução) e não nas germinativas (responsáveis pela formação de óvulos ou espermatozoides)?

A explicação para a renovação do DNA

Aí é que entra a teoria da otimização do genoma. Conforme as células evoluem através das diferentes fases da vida, elas podem querer se livrar do “excesso de bagagem”. Assim como nós, ao crescer, deixamos de lado nossos brinquedos de infância, as células podem desejar eliminar genes que eram cruciais na fase embrionária, mas que, na maturidade, só ocupam espaço. 

Ser eficiente é fundamental, afinal, manter um genoma gigantesco não é uma tarefa fácil e pode até causar problemas se genes de desenvolvimento forem ativados de forma inadequada.

As células somáticas têm uma perspectiva diferente das células germinativas, e se não precisam transmitir um genoma completo para a próxima geração, então, por que não descartar o que não é mais necessário? Essa poderia ser a estratégia evolutiva campeã para elas, mas isso é o que os cientistas ainda não sabem explicar.

A verdade é que não se sabe exatamente por que o PDE acontece, e esse fenômeno contraria muitos conceitos genéticos que tínhamos como certos. E por ser pouco estudado, e por contradizer teorias tão consolidadas, qualquer hipótese poderia ser válida.

É exatamente por isso que Delattre insiste na importância de expandir as pesquisas sobre PDE. Se existe em outras espécies que desconhecemos, precisamos procurar e entender por que alguns organismos adotam essa abordagem tão drástica e ousada em relação ao seu genoma. Wells sugere que é bem provável que o PDE seja mais comum do que pensamos.

Estudar esses fenômenos sobre DNA é importante e não se sabe a que caminhos pode abrir para a ciência. Esse mistério da biologia de um verme ainda nos traz muito mais perguntas do que respostas… vai saber se um dia poderá nos dizer alguma coisa sobre o nosso próprio DNA, como outro verme já disse sobre nosso cérebro


Fonte: Quanta Magazine

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