Em nossa sociedade, eventos macabros que exploram temas de morte, desastre e sofrimento têm atraído um público cada vez maior. De festivais culturais como o Dia de los Muertos, a passeios turísticos temáticos como as Caminhadas de Jack, o Estripador, e até mesmo celebrações mais formais como o Dia da Lembrança, o fascínio por essas experiências macabras levanta questões importantes sobre a natureza humana e o papel desses eventos em nossa cultura.
Um estudo recente conduzido por pesquisadores da Universidade de Surrey oferece perspectivas interessantes sobre essa atração, oferecendo uma nova estrutura para entender por que somos tão atraídos por esses “eventos macabros”. Com base em disciplinas como tanatologia (estudo científico da morte e dos processos relacionados a ela), turismo sombrio e estudos de memória coletiva, os pesquisadores identificaram seis conceitos-chave que ajudam a explicar essa curiosidade pelo macabro.
Além de revelar os motivos por trás da nossa atração pelo macabro, o estudo amplia nossa perspectiva sobre o papel desses eventos na sociedade contemporânea.
O primeiro ponto crucial para entender nossa atração por eventos centrados na morte é a curiosidade humana natural. A morte, sendo um dos poucos eventos universais que todos inevitavelmente enfrentamos, desperta um interesse profundo e instintivo. Contudo, a morte também é um tema cercado por tabus e medos, o que torna a exploração desses temas em um ambiente controlado especialmente atraente.
Eventos como o Dia de los Muertos, por exemplo, oferecem uma maneira culturalmente sancionada de confrontar a morte de maneira simbólica e até mesmo celebratória. Nesse contexto, as pessoas não apenas satisfazem sua curiosidade, mas também participam de um rito cultural que oferece consolo e significado em relação à mortalidade. Essa exploração cultural e psicológica torna esses eventos tidos como macabros não apenas intrigantes, mas também emocionalmente enriquecedores.
Um dos aspectos mais destacados pelo estudo é o processo de comercialização desses eventos macabros. Hoje, a morte e o desastre são, de certa forma, produtos que podem ser vendidos e consumidos. Festivais, passeios turísticos e até mesmo atrações de horror são embalados de maneiras que os tornam acessíveis e atraentes para o público em geral.
Essa comercialização desempenha um papel importante na popularidade desses eventos. Ao transformar a morte em uma experiência consumível, essas iniciativas ampliam o alcance desses eventos e os tornam uma parte do mercado global de entretenimento macabro. A morte, que antes era tratada como um tema sombrio e privado, agora é algo que pode ser explorado publicamente, gerando lucro e atraindo grandes audiências.
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Engajamento como macabro
Outro fator crucial identificado pelos pesquisadores é o engajamento desses eventos com a esfera pública. Eventos macabros muitas vezes se tornam parte do discurso social mais amplo, influenciando e refletindo as normas e valores da sociedade. A maneira como esses eventos são cobertos pela mídia, discutidos em arenas políticas e percebidos pelo público em geral pode ter um impacto significativo em como a sociedade lida com temas de morte e tragédia.
Por exemplo, o Dia da Lembrança não é apenas uma cerimônia para honrar os mortos de guerra; é também um momento de reflexão coletiva sobre a violência, o sacrifício e as consequências do conflito. Esse engajamento com a esfera pública torna esses eventos uma plataforma para discutir questões complexas e importantes, muitas vezes influenciando as atitudes e comportamentos sociais em relação à morte e ao desastre.
Uma atração menos discutida, mas igualmente importante, por esses eventos macabros é o desejo de explorar comportamentos desviantes. Participar de eventos que envolvem temas de violência, criminalidade ou outros tabus pode oferecer uma maneira segura de explorar o desconhecido e o proibido. Essa busca por emoção e o desejo de desafiar as normas sociais pode ser uma forte motivação para aqueles que frequentam esses eventos.
Passeios temáticos sobre serial killers ou casas mal-assombradas, por exemplo, permitem que os participantes enfrentem seus medos em um ambiente controlado, onde o perigo é simulado, mas as emoções são reais. Essa exploração de comportamentos desviantes pode ser vista como uma forma de catarse, permitindo que as pessoas confrontem e processem emoções difíceis de maneira segura.
Os aspectos emocionais e experienciais desses eventos macabros são centrais para sua atração. A capacidade desses eventos de evocar emoções intensas, como medo, fascinação ou reflexão, é uma das principais razões pelas quais as pessoas continuam a se envolver com eles. Esses eventos oferecem uma oportunidade para os participantes vivenciarem emoções que são, em muitos aspectos, raras no dia a dia.
Ao confrontar a morte e o desastre de maneira direta, mas segura, os participantes podem experimentar uma gama de emoções profundas e significativas. Essas experiências muitas vezes levam a uma reflexão pessoal e até mesmo a mudanças na perspectiva sobre a vida e a morte. O impacto emocional desses eventos é, portanto, uma parte crucial de sua popularidade e apelo.
Finalmente, a presença simbólica e literal da morte nesses eventos é um elemento chave de sua atração. Seja através de símbolos culturais, como caveiras e esqueletos no Dia de los Muertos, ou a presença literal da morte em locais históricos de tragédia, esses eventos macabros oferecem uma maneira tangível de confrontar a mortalidade.
Essa presença da morte, tanto simbólica quanto real, permite que os indivíduos explorem a natureza da mortalidade de uma forma que é, ao mesmo tempo, pessoal e coletiva. Ao participar desses eventos, as pessoas não apenas confrontam sua própria mortalidade, mas também se conectam com uma experiência humana universal. Esse confronto direto com a morte, em um contexto seguro e estruturado, pode ser profundamente transformador, oferecendo uma nova compreensão e aceitação da inevitabilidade da morte.
Em suma, a atração por eventos centrados na morte e no desastre é complexa e apresenta muitas nuances a serem consideradas, envolvendo uma mistura de curiosidade natural, exploração cultural, comercialização, engajamento público, busca por emoções, e a presença simbólica e literal da morte.
Em última análise, esses eventos macabros nos oferecem uma oportunidade única de explorar, entender e, talvez, fazer as pazes com um dos aspectos mais fundamentais da experiência humana: a morte. Podemos assim explorar as emoções e até o autoconhecimento, à medida que esses eventos oferecem uma maneira segura e controlada de explorar temas que são, por sua natureza, desconfortáveis e muitas vezes evitados.
Fonte: Neuroscience News