Teorias da conspiração acarretam condições psicológicas complexas, o que torna fundamental entender a relação da nossa curiosidade mórbida com essas teorias que estão cada vez mais presentes.
Muitas pessoas gostam de uma boa história assustadora, podcasts de crimes reais ou esportes violentos. Esses conteúdos, apesar de seu teor sombrio, têm um apelo irresistível para muitos de nós, atiçando nossa curiosidade mórbida, aquele interesse aguçado em aprender mais sobre situações ameaçadoras ou perigosas. Este fenômeno psicológico tem sido alvo de estudos e pesquisas, revelando facetas intrigantes da natureza humana.
De acordo com pesquisas recentes publicadas no renomado British Journal of Psychology, envolver-se com mídias assustadoras em um ambiente seguro pode, paradoxalmente, ajudar a aliviar a ansiedade e construir resiliência psicológica. Entretanto, existe um lado sombrio nesta história: aqueles que possuem um nível elevado de curiosidade mórbida podem ser mais vulneráveis às teorias da conspiração.
As teorias da conspiração oferecem explicações alternativas para eventos perturbadores, muitas vezes envolvendo grupos maliciosos que operam nas sombras. De satanistas colhendo sangue a lagartos alienígenas disfarçados, essas teorias desafiam as explicações convencionais e precisam de evidências concretas. Mas ainda assim, elas atraem a atenção de muitos, criando uma teia de crenças e suposições.
Teorias da conspiração x curiosidade mórbida
Para entender melhor essa conexão entre curiosidade mórbida e teorias da conspiração, pesquisadores conduziram três estudos distintos, com participantes de diferentes grupos e uma divisão quase igual entre os gêneros. O primeiro estudo buscou responder à pergunta: a curiosidade mórbida está ligada a uma maior crença em teorias da conspiração? Utilizando a escala de curiosidade mórbida e a escala de crenças conspiracionistas genéricas, os resultados mostraram que, de fato, quanto mais morbidamente curiosas as pessoas eram, maior era a sua crença geral em teorias da conspiração.
O maior interesse em saber sobre situações ameaçadoras ou perigosas é o que determina a curiosidade mórbida na psicologia, e ela pode ser medida utilizando a escala de curiosidade mórbida geral, e em quatro domínios: mentes de pessoas perigosas, violência, perigo paranormal e violação corporal. Violência ocorre quando a curiosidade é sobre a ação em si (como uma luta de boxe). Lesão corporal é a curiosidade sobre as consequências da violência (como ir a um museu cirúrgico).
Vale ressaltar alguns detalhes decorrentes do resultado do primeiro estudo: a curiosidade mórbida não é exclusiva de um grupo demográfico específico; e jovens tendem a ser mais morbidamente curiosos, mas não há uma grande divisão de gênero nesse aspecto.
O segundo estudo mergulhou mais fundo, examinando se a ligação entre curiosidade mórbida e interesse em teorias da conspiração era impulsionada pela percepção das pessoas sobre ameaças. Os participantes avaliaram o quão ameaçadoras achavam várias explicações para eventos, incluindo explicações convencionais e conspiratórias. Os resultados confirmaram que, quanto maior a curiosidade mórbida, maior era a percepção de ameaça nas explicações conspiratórias.
No terceiro e último estudo, os pesquisadores exploraram se a curiosidade mórbida fazia com que as pessoas fossem mais propensas a buscar teorias da conspiração como explicações para eventos. Os participantes tiveram que escolher entre descrições emparelhadas, algumas morbidamente curiosas e outras não, e algumas explicativas conspiratórias vs. convencionais. Aqueles com níveis mais elevados de curiosidade mórbida eram mais propensos a se interessar por explicações conspiratórias.
Nos três estudos, os participantes com curiosidade mórbida era mais propensos a ter crenças conspiratórias gerais, considerar as teorias da conspiração mais ameaçadoras e a demonstrar um interesse maior em saber mais sobre essas explicações conspiratórias. E tem algo curioso: A curiosidade mórbida dominante é a que estava mais fortemente ligada às teorias sobre “mentes de pessoas perigosas”.
Implicações psicológicas da curiosidade mórbida
Mas por que, especificamente, a curiosidade sobre “mentes de pessoas perigosas” está tão fortemente ligada ao interesse em teorias da conspiração? A resposta pode estar em nossa biologia evolutiva.
Durante grande parte da evolução humana, grupos hostis representaram uma ameaça significativa. O desenvolvimento da linguagem permitiu uma coordenação mais premeditada e, por vezes, enganosa das ações humanas, tornando essencial para nossa sobrevivência sermos curiosos sobre as intenções de pessoas potencialmente perigosas.
Viver em um mundo complexo e moderno pode ser desafiador, e ativa nossa antiga curiosidade mórbida, tornando-nos alertas a possíveis ameaças e isso tem implicações psicológicas.
Em tese, a curiosidade mórbida não é invariavelmente ruim, mas um interesse excessivo nas percepções de perigo apresentadas pelas teorias da conspiração pode reforçar a crença de que vivemos em um mundo perigoso, criando um ciclo vicioso, aumentando a ansiedade e impulsionando as pessoas ainda mais para o mundo obscuro das teorias da conspiração.
Compreender a ligação entre curiosidade mórbida e teorias da conspiração é essencial para abordar os possíveis impactos negativos na condição psicológica individual e coletiva.
É crucial navegar por esses territórios prezando pelo bom senso e discernimento, para que possamos satisfazer nossa sede de conhecimento sem cair nas armadilhas da desinformação e do medo infundado.
Fonte: Scientific American