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Tratamento da depressão com estímulos elétricos em casa mostra resultados promissores

A depressão resistente a tratamentos convencionais, como medicamentos e terapia, é um desafio crescente na área de saúde mental. Uma nova abordagem, usando uma leve corrente elétrica direcionada ao cérebro, conhecida como Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (tDCS – do inglês transcranial direct current stimulation), está abrindo portas para uma solução acessível e inovadora: o tratamento de depressão realizado em casa. Essa técnica tem ganhado destaque em estudos recentes e pode beneficiar o público que luta com a falta de resposta aos tratamentos tradicionais.

Um ensaio clínico conduzido remotamente, com mais de 150 participantes, trouxe evidências sobre o potencial dessa tecnologia. No estudo, os participantes utilizaram um dispositivo experimental, um tipo de “capacete” que envia pequenos estímulos elétricos para áreas específicas do cérebro, e os resultados foram bastante promissores. Para compreender a importância desse avanço, é interessante observar como a tDCS funciona e quais foram as descobertas desse estudo.

Como a estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (tDCS) funciona?

O tDCS é uma técnica não invasiva que estimula o cérebro através de eletrodos posicionados no couro cabeludo. Ao contrário de técnicas mais intensas, como a eletroconvulsoterapia, o tDCS não causa desconforto e utiliza uma corrente muito fraca, que não gera dor ou efeitos colaterais significativos. Sua função é estimular regiões cerebrais associadas à regulação do humor, ajudando a “despertar” essas áreas em pessoas que sofrem de depressão e cujas funções nessas regiões podem estar inibidas.

O alvo principal desse estímulo é o córtex pré-frontal dorsolateral, uma área do cérebro que desempenha papel central na tomada de decisões e no processamento de emoções. Estudos demonstraram que essa região apresenta uma atividade reduzida em pessoas com depressão, e a corrente elétrica, de baixa intensidade, ajuda a aumentar a atividade nessas células, facilitando a “disparada” dos neurônios dessa região, o que pode contribuir para a melhoria dos sintomas.

Publicado recentemente na Nature Medicine, o estudo envolveu 120 mulheres e 54 homens diagnosticados com transtorno depressivo maior. O diferencial desse ensaio foi o uso de um formato remoto, o que significa que os participantes podiam realizar o tratamento em casa, sem a necessidade de visitas constantes a clínicas especializadas, como normalmente é exigido para tratamentos neuromoduladores. Esse formato remoto favorece a adesão ao tratamento, especialmente para pessoas com limitações de acesso ou mobilidade.

Os participantes foram divididos em dois grupos: o grupo de tratamento, que utilizou o tDCS real, e o grupo de controle, que usou um dispositivo “placebo”. No grupo de tratamento, uma corrente de 2 miliamperes foi aplicada por 30 minutos em cada sessão, durante cinco dias na primeira fase de três semanas e, posteriormente, três vezes por semana nas sete semanas seguintes. O grupo de controle utilizou um dispositivo similar, mas que simulava o tratamento sem realmente aplicar a corrente de forma contínua, proporcionando apenas uma breve descarga inicial, o suficiente para gerar uma leve sensação e imitar a experiência sem o efeito terapêutico.

Ao final das dez semanas de tratamento, os participantes que usaram o tDCS ativo apresentaram uma redução média de 9,41 pontos em uma escala que mede os sintomas da depressão, enquanto o grupo de controle teve uma redução média de 7,14 pontos. Além disso, quase 45% dos participantes que receberam o tratamento ativo relataram uma diminuição significativa ou até mesmo remissão dos sintomas, comparado a cerca de 22% daqueles que usaram o dispositivo placebo.

Esses números mostram que o tDCS pode realmente fazer diferença para pacientes com depressão que não respondem bem a outros tipos de tratamento, incluindo medicamentos e psicoterapia. Importante ressaltar que os participantes do estudo também continuaram com outros tratamentos convencionais durante o ensaio, como antidepressivos e terapia, evidenciando que o tDCS pode ser uma abordagem complementar aos métodos já utilizados.

Limitações e perspectivas futuras no tratamento da depressão

Apesar dos resultados encorajadores, a eficácia do tDCS não é universal. Outros estudos realizados anteriormente indicam que o tDCS pode não ser igualmente benéfico para todos os pacientes. Por exemplo, um estudo de 2023 com 150 pessoas não demonstrou efeito antidepressivo significativo da técnica. Esse contraste entre estudos indica que ainda é preciso entender melhor as variáveis que influenciam o sucesso do tDCS. Segundo especialistas, como Frank Padberg, psiquiatra da Universidade Ludwig Maximilian em Munique, é crucial avançar na personalização do tratamento, ajustando a dosagem e explorando os fatores que determinam a resposta individual ao tDCS.

Uma área promissora de pesquisa contra a depressão é o uso de tecnologias de imagem cerebral e gravações elétricas para monitorar o que ocorre nos circuitos neurais durante as sessões de tDCS. Observar essas mudanças em tempo real poderia revelar como o tratamento atua nas redes neurais e ajudar a identificar quais pacientes poderiam se beneficiar mais com o uso do tDCS, abrindo espaço para um tratamento mais direcionado e eficaz.

A possibilidade de realizar tratamentos neuromoduladores em casa representa um avanço significativo na acessibilidade dos cuidados com a saúde mental. A barreira da acessibilidade, tanto financeira quanto geográfica, é um fator importante na adesão e na continuidade dos tratamentos, e opções que permitem a continuidade dos cuidados no ambiente doméstico são bem-vindas. Como aponta o neuropsicólogo Shawn McClintock, do Centro Médico UT Southwestern, em Dallas, a viabilidade de realizar tratamentos como o tDCS em casa pode ajudar a tornar o cuidado com a saúde mental mais acessível a uma população mais ampla.

Além disso, a pesquisa em torno do tDCS sugere que estamos apenas começando a explorar o potencial da estimulação cerebral como terapia para doenças mentais. Embora existam desafios a serem superados, como a variabilidade na resposta ao tratamento, o avanço das pesquisas na área aponta para um futuro no qual métodos como o tDCS possam se tornar parte do arsenal terapêutico padrão para o tratamento de condições complexas como a depressão.

A estimulação transcraniana por corrente contínua (tDCS) representa uma inovação promissora no tratamento da depressão, oferecendo uma alternativa segura e prática que, se refinada e personalizada, poderá transformar a forma como entendemos e tratamos a depressão resistente a tratamentos. 

Fonte: Nature

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