Um novo modelo detalhado de um milímetro cúbico do cérebro humano, apresentado na revista científica Science, apresentou uma visão incrível da complexidade de dentro das nossas cabeças! O modelo, já disponível online, é uma grande revelação de detalhes nanométricos de nossa complexa arquitetura cerebral.
O mapa é tão inédito e tão incrível que levou Viren Jain, um dos autores do estudo, a relatar a experiência manifestando toda a admiração decorrente do grande avanço: “Parecia meio espiritual!”
Este projeto, liderado por cientistas do Google em Mountain View, Califórnia, nos Estados Unidos, destaca a capacidade quase inimaginável da tecnologia moderna de mapear o cérebro humano com uma precisão sem precedentes. Viren Jain, neurocientista e coautor do estudo, descreve a experiência como “um pouco humilhante“, considerando a imensa complexidade que ainda temos que entender. A equipe de Jain conseguiu modelar um fragmento muito pequeno do córtex cerebral – a camada mais externa do cérebro, responsável por funções vitais como aprendizado, resolução de problemas e processamento sensorial.
O fragmento estudado veio de uma paciente de 45 anos, submetida a uma cirurgia para tratar epilepsia. O tecido cerebral, após ser removido, foi preservado e tratado com metais pesados para facilitar a visualização das células sob um microscópio eletrônico. Em seguida, foi meticulosamente fatiado em cerca de 5.000 lâminas, cada uma com apenas 34 nanômetros de espessura. Aí começa o trabalho de verdade: cada fatia foi digitalizada para formar o gigantesco mapa tridimensional de um pedaço tão pequeno de cérebro.
Para construir este modelo 3D, a equipe utilizou modelos de inteligência artificial que costuraram essas imagens microscópicas em uma representação completa e tridimensional do fragmento cerebral. O mapa resultante cobre um volume de cerca de um milímetro cúbico, contendo aproximadamente 57.000 células e 150 milhões de sinapses, que são as conexões entre os neurônios. A quantidade de dados gerados é astronômica, somando 1.4 petabytes.
Vale lembrar que 1 petabyte são 1.000 terabytes ou um milhão de gigabytes. Só pra ter uma noção concreta do quão gigantesco é isso: 1 petabyte pode armazenar cerca de 500 bilhões de páginas de texto padrão ou mais de 200.000 DVDs de qualidade padrão.
Ao explorar este vasto mapa, os pesquisadores descobriram características neuronais que desafiam o entendimento atual. Neurônios com até 50 conexões uns com os outros foram observados, um número significativamente maior do que as poucas conexões típicas conhecidas anteriormente. Além disso, certos neurônios mostraram ter seus dendritos – as estruturas que recebem sinais de outros neurônios – formando padrões que se assemelham à formação de nós, enquanto outros pares de neurônios apresentaram uma simetria quase perfeita, espelhando um ao outro em disposição e orientação.
Essas descobertas têm o potencial de transformar nossa compreensão de como o cérebro humano funciona, especialmente no que se refere ao processamento de informações e à aprendizagem. A complexidade dessas conexões pode oferecer novas pistas sobre como tratamos informações sensoriais e resolvemos problemas, além de abrir novas frentes na luta contra doenças neurodegenerativas e psiquiátricas.
Já foram gastos mais de 600 milhões de euros para tentar replicar o cérebro humano em um sistema sintético e os resultados… bem, clica aqui para ver!
A investigação do cérebro está só começando
No entanto, apesar do avanço significativo, o caminho à frente ainda é longo e desafiador. A equipe de Jain enfatiza que grande parte do mapa ainda não foi verificada manualmente devido à sua vastidão e à natureza intrincada dos dados. Apenas uma fração das células foi ‘revisada’, e potenciais erros no processo de compilação das imagens ainda podem existir. Por isso, os pesquisadores convidam a comunidade científica mundial a colaborar na revisão e exploração desse riquíssimo dataset.
O acesso livre a esses dados promete revolucionar a neurociência, oferecendo a cientistas ao redor do mundo a oportunidade sem precedentes de explorar as minúcias da arquitetura do cérebro. Hongkui Zeng, diretor do Instituto Allen de Ciência do Cérebro, em Seattle, refere-se a essa conquista como uma criação resultando de habilidades e esforços excepcionais, destacando o grande valor do conjunto de dados do córtex humano agora acessível.
O impacto desse estudo é vasto, cheio de nuances e possibilidades, estendendo-se além dos laboratórios e instituições de pesquisa. Ao oferecer uma visão tão detalhada do funcionamento interno do cérebro, ainda que, por ora, de uma pequena fração, os pesquisadores fornecem um mapa que pode guiar a ciência atual e também iluminar caminhos para futuras gerações de neurocientistas. A capacidade de examinar o cérebro a esse nível de detalhe é uma conquista sem precedentes na busca de desvendar os mistérios da mente.
Como Yongsoo Kim, neurocientista da Universidade Estadual da Pensilvânia, aponta: “Este mapa fornece detalhes sem precedentes que podem revelar novas regras de conexões neurais e ajudar a decifrar o funcionamento interno do cérebro humano“, contribuindo para compreensão da imensa complexidade do cérebro que dá origem a pensamentos, emoções, memórias e a própria consciência.
Fonte: Nature