Arte pré-histórica? Pois é! Aninhado nas montanhas escarpadas da Namíbia Ocidental encontra-se uma maravilha histórica que tem chamado a atenção de pesquisadores e entusiastas: uma enorme tela esculpida, que registra pegadas humanas e animais. Esta bacia rochosa é uma viagem visual através do tempo, fornecendo insights fascinantes para a ciência sobre as habilidades e cultura dos caçadores-coletores pré-históricos.
Uma escavação em Doro, na Namíbia, descobriu uma bacia repleta de gravuras antigas. Em meio às Montanhas Nawas, há milhares de anos, nossos antepassados viram essa bacia de arenito como o meio perfeito para documentar seu ambiente. As pegadas que eles esculpiram nestes rochedos não eram meras impressões, eram registros realistas do seu entorno, e são tão detalhados que os rastreadores indígenas de hoje ainda podem identificar, em mais de 90% dos casos, a espécie, o sexo, a idade geral e até mesmo a perna específica do animal ou ser humano retratado.
Gary Haynes, antropólogo da Universidade de Nevada, Reno, ao observar estas esculturas, disse que são uma contribuição notável para a nossa compreensão da arte rupestre pré-histórica, por não se tratarem apenas de um testemunho das avançadas habilidades artísticas dos indivíduos da Idade da Pedra, mas também por exibir a essência eterna das interações entre natureza e seres humanos, contemplando milhares de anos.
A recorrência de pegadas na arte rupestre antiga não é exclusiva da Namíbia. Por todo o mundo, desde a Europa até a Ásia, encontram-se pegadas humanas e trilhas animais eternizadas em superfícies rochosas pré-históricas. Este fenômeno global nos faz questionar o que poderia ter levado nossos ancestrais a documentar essas pegadas, além de outras figuras humanas e padrões geométricos.
Para descobrir mais sobre estas misteriosas pegadas, um grupo de arqueólogos alemães se propôs a investigar este recentemente descoberto sítio na Namíbia. Descobriram que a bacia do sítio, semelhante a uma cratera, abrigava múltiplos rochedos de arenito, cobertos com gravuras que remontam ao último milênio a.C. Embora algumas representações fossem de figuras humanas e de criaturas majestosas como elefantes e girafas, a maioria eram inegavelmente pegadas.
Os arqueólogos alemães trabalharam em colaboração com três especialistas em rastreamento Ju/’hoansi do Conservatório Nyae Nyae em Tsumkwe, Namíbia. Estes especialistas em rastreamento indígena não são novos no mundo da pesquisa. Tsamgao Ciqae, /Ui Kxunta e Thui Thao têm sido fundamentais na decodificação de inúmeros outros estudos de arte rupestre antiga dos pesquisadores ocidentais há mais de 10 anos. É fascinante ver como a combinação do conhecimento indígena com a ciência arqueológica ocidental está preenchendo as lacunas entre o passado e o presente.
Quando estes especialistas se aprofundaram nas pegadas, com precisão e sensibilidade cultural, conseguiram identificar com confiança trilhas de 39 diferentes espécies animais nas 513 gravuras que examinaram.
O que é fascinante é que, enquanto muitas gravuras retratavam animais como rinocerontes, javalis, babuínos e zebras, que hoje estão na área rochosa e árida perto das esculturas, outras figuras retratavam criaturas como o gnus azuis, cegonhas-de-bico-aberto e porcos-do-mato, típicos de ambientes mais úmidos, que não são encontrados na região atualmente. Isso levanta possibilidades intrigantes: a região era mais úmida há milhares de anos atrás? Ou estes artistas estavam relembrando trilhas de terras mais úmidas que eles visitaram?
Uma coisa é indiscutível: estes caçadores-coletores eram artistas por excelência. Suas representações habilidosas, possibilitaram muita clareza para os rastreadores até os dias de hoje. É incrível pensar sobre como estas representações, criadas há tanto tempo, podem oferecer insights tão detalhados, muitas vezes superando as capacidades arqueológicas modernas.
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Além da arte: Mensagem e possíveis intenções
A extensa variedade de pegadas apresentaram alguns padrões. Pegadas de girafas foram gravadas muito mais do que as de leões e elefantes. Curiosamente, os artistas inclinavam-se mais para mostrar animais adultos do que juvenis, e pegadas masculinas pareciam dominar sobre as femininas.
Isso levantou uma proposição interessante de nossos rastreadores indígenas: estas gravuras serviriam como ferramentas educacionais? Talvez, ao observar estas esculturas, aqueles que se aventuravam pela região pela primeira vez poderiam, através das diferenças nas gravuras, identificar as diversas espécies de animais, suas idades e gêneros, e assim, tornarem-se aptos a rastreá-los com mais eficácia.
Contudo, o sítio em Doro em Nawas não parece ser o cenário típico de uma “sala de aula”, segundo os especialistas. Em várias partes da galeria, a iluminação é precária, e algumas representações foram meticulosamente esculpidas no nível do solo, precisamente nas cavidades internas de uma estreita fenda, e para acessar essas imagens, é preciso deitar e deslizar através de uma abertura no arenito.
Portanto, o verdadeiro motivo por trás dessas gravuras tão detalhadas ainda é um mistério. Apenas o tempo e pesquisas adicionais revelarão verdadeiramente as intenções destes artistas pré-históricos.
Nas palavras de Gary Haynes, estas gravuras podem conter significados mais profundos, talvez pessoais para quem as registrou, e ressoam através do tempo, nos tocando até hoje.
Em essência, o sítio Doro, na Namíbia, não oferece apenas gravuras; oferece histórias, legados e uma conexão inabalável com nossas raízes. Além de obras de arte impressionantes, essas gravuras são uma viagem no tempo até o coração da história humana.
Fonte: Science