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O Universo como um computador quântico?

O Universo pode funcionar como um computador quântico? Imagine o nosso cosmos, das partículas mais minúsculas às vastas galáxias, sendo governado por regras computacionais. E se essas regras pudessem potencialmente fornecer uma visão mais clara da evolução do universo do que a física tradicional?

No coração desta ideia revolucionária estava um homem chamado Edward Fredkin. Infelizmente, sua morte em junho passou relativamente despercebida por muitos, mesmo que seus pensamentos e teorias tenham impactado significativamente tanto a ciência da computação quanto a física. 

Fredkin ousou propor que talvez as leis da física e, em essência, o Universo inteiro são subprodutos de um algoritmo de computador super avançado. Ele denominou essa ideia inovadora de ‘física digital’. 

Inicialmente, isso foi visto como uma proposta um pouco radical. Mas, como muitas ideias geniais que desafiam o status quo, ela foi gradualmente ganhando tração e agora está quase no mainstream.

Um dos colaboradores mais próximos de Fredkin, Norman Margolus, relembra os primeiros dias, quando enfrentaram ceticismo. Muitos na comunidade científica ergueram as sobrancelhas para a noção de mesclar ciência computacional e física.

Mas quem foi Edward Fredkin para ciência?

Quem foi esse homem por trás desta teoria audaciosa? Uma rápida olhada nesse pontos de sua trajetória já nos mostra que ele não era um acadêmico comum:

  • Apesar de sua enorme inteligência, ele não permaneceu no Caltech para obter um diploma.
  • Em 1953, ele estava voando alto, literalmente, como piloto de caça e instrutor da Força Aérea dos EUA.
  • Sua virada para a ciência da computação aconteceu em 1956, cortesia da Força Aérea.
  • Logo depois, ele estava no Laboratório Lincoln do MIT, usando computadores para decodificar dados de radar.
  • Em 1958, ele já estava profundamente envolvido na pesquisa de IA na Bolt Beranek & Newman.
  • Espírito empreendedor? Ele tinha isso também, fundando a Information International, focada em tecnologia de imagem pioneira.
  • E, como verdadeiro testemunho da sua genialidade, ele voltou ao MIT em 1968 como professor, tudo isso sem o tradicional laurel de um diploma de graduação.

Fredkin também esteve à frente do Projeto MAC no MIT, que lançou as bases para o renomado Laboratório de Ciência da Computação do MIT. Margolus pinta um retrato de um homem que não estava apenas limitado às salas de aula, mas era um visionário que fez ondas no mundo real, mostrando uma expertise incomparável.

Da defesa da inteligência artificial à gênese da computação quântica

Abordamos a jornada única de Edward Fredkin e sua ideia audaciosa de que nosso universo pode ser semelhante a um colossal computador quântico. Mas há mais neste enigma. Indo mais além, a capacidade de Fredkin revela um tesouro de pensamentos futurísticos sobre inteligência artificial, conceitos revolucionários em computação reversível (que era considerada impossível na época), e seu papel indispensável no nascimento da era da computação quântica.

Voltando aos anos 1960, uma época em que a inteligência artificial estava muito mais na teoria do que na prática, Fredkin teve a visão de ver seu poder crescente. Ele não estava apenas interessado no código ou algoritmos, ele reconheceu os enormes desafios políticos que a inteligência artificial representava, particularmente no delicado campo da segurança nacional. 

Em uma jogada que era tanto visionária quanto cheia de esperança, ele defendeu fervorosamente a colaboração internacional na pesquisa de IA, com o objetivo de encontrar medidas preventivas contra possíveis usos indevidos, mas infelizmente, apesar dos melhores esforços, suas tentativas de convocar uma reunião internacional sobre a inteligência artificial fracassaram. E não podemos deixar de nos perguntar como seria a paisagem hoje se as potências globais tivessem atendido ao seu chamado.

Lá em 1974, Fredkin, sempre o acadêmico nômade, levou seus talentos do MIT para os ensolarados corredores do Caltech. Lá, ele se misturou com os gigantes científicos da época: o incomparável Richard Feynman e o brilhante Stephen Hawking. 

Só para resumir quem eram esses caras: Feynman foi um físico teórico norte-americano, laureado com o Prêmio Nobel de Física em 1965, conhecido por seus trabalhos em eletrodinâmica quântica e por sua habilidade única de comunicar conceitos científicos complexos ao público em geral. E Hawking, britânico, outro físico teórico, conhecido por seus trabalhos sobre buracos negros e por obras famosas como “Uma Breve História do Tempo“.

A sede de conhecimento e inovação de Fredkin era insaciável. Ele passou para posições de professor na Universidade Carnegie Mellon e, mais tarde, na Universidade de Boston. Foi nesse período que ele mergulhou nas águas então desconhecidas da computação reversível.

Falando um pouquinho desse conceito radical da computação reversível: Os computadores tradicionais processam informações de uma maneira que, uma vez feito, não pode ser revertido. Esse processo apaga a entrada e produz calor residual. 

Mas Fredkin, juntamente com seus colaboradores, o já mencionado Margolus e um jovem engenheiro elétrico italiano, Tommaso Toffoli, introduziu uma reviravolta inovadora: uma porta lógica conhecida como porta Fredkin, que poderia reverter cálculos. Seu artigo seminal de 1982 insinuou uma possibilidade tentadora: um computador que usasse essas portas, em teoria, poderia não expelir calor residual nem consumir energia. Embora o conceito tivesse imensa promessa, ele não foi concretizado no mundo da computação clássica.

O legado de Fredkin não está apenas confinado a artigos teóricos e portas inovadores. Ele, juntamente com Toffoli, organizou o Simpósio de Física da Computação de 1981, no MIT, que não era apenas mais um congresso acadêmico. 

Entre seus participantes estava o ilustre Feynman, que apresentou uma ideia de que certos sistemas físicos que exibem comportamentos quânticos poderiam ser melhores para computação do que tentar simular fenômenos quânticos em bons e velhos computadores clássicos. De muitas maneiras, esse simpósio é considerado o marco zero para a revolução da computação quântica.

Hoje, o sonho do computador quântico está se aproximando da realidade: Máquinas aproveitando a mecânica quântica para resolver problemas em velocidades que os computadores clássicos jamais poderiam. 

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Embora ainda estejam nos primeiros passos, estamos vendo protótipos desses computadores quânticos. E aqui está o ponto principal: embora seus sistemas de suporte possam ser grandes consumidores de energia, as operações lógicas quânticas reais são surpreendentemente quase sem perdas.

Agora, vamos falar um pouco da tal da física digital. 

Seth Lloyd, engenheiro mecânico do MIT, que, aliás foi quem, em 1993, desenvolveu aquele que é considerado o primeiro conceito realizável para um computador quântico, defende a essencialidade da harmonia intrincada da computação reversível e dos computadores quânticos para a concepção de computadores quânticos. 

Curiosamente, Charles Bennett, físico da IBM, também explorava terrenos semelhantes com seus próprios modelos de computação reversível. Mas foi o trio – Fredkin, Toffoli e Margolus – que assumiu o protagonismo. Seus revolucionários modelos de zero dissipação se tornaram a base sobre a qual a computação quântica foi construída.

Falando de Fredkin e Toffoli, seu artigo de 1982 merece destaque. Imagine uma mesa de bilhar — lisa, verde, é um centro de atividades das bolas de bilhar. Os dois físicos genialmente usaram esta mesa como analogia, representando cálculos matemáticos através das interações reversíveis das bolas de bilhar em uma mesa sem atrito.

Essa inspiração não foi apenas criatividade por si só. Toffoli estava ancorado em uma ideia ousada: talvez, apenas talvez, conceitos computacionais pudessem ser mais adequados para descrever a física do a equação diferencial.

Agora, vamos à Fredkin e sua teoria do Universo como um computador. Imagine o universo não como uma vasta expansão de estrelas e galáxias, mas como um ‘autômato celular’ – pense em uma vasta grade de bits computacionais, ou células. Cada célula opera com base em um conjunto de regras determinadas por seus estados vizinhos. Ao longo de eras, essas regras simples poderiam tecer o intricado mosaico do universo, seus elementos e, sim, até mesmo a vida.

Acontece que talvez algo assim já tivesse aparecido: Voltando às páginas da história, encontramos Konrad Zuse, o engenheiro civil alemão por trás de algumas maravilhas de computador pré-Segunda Guerra Mundial.

Sua obra de 1969, “Calculating Space”, se referia ao universo como um autômato celular digital. Avançando no tempo, Fredkin e companhia estavam profundamente imersos nesta ideia, ligando regras computacionais rudimentares ao enigmático mundo dos fenômenos subatômicos.

No entanto, como acontece com qualquer teoria inovadora da ciência, houve uma boa dose de ceticismo e crítica. Philip Morrison, então também docente do MIT, com um tom irônico, ponderou que talvez Fredkin visse o Universo como um grande computador cósmico porque ele era um cientista da computação.

Mas então veio o livro do cientista da computação britânico, Stephen Wolfram, em 2002, “A New Kind of Science“, que ecoou proposições estranhamente semelhantes. Fredkin, com seu humor clássico, comentou como se sentiu um pouco menos “solitário” em suas crenças após o lançamento do livro.

Até hoje as ideias continuam a evoluir. Explorações modernas deram origem a termos como ‘pancomputacionalismo‘ e ‘digitalismo‘. Estes não são apenas jargões; são endossados por gigantes como o ganhador do Nobel de física holandês, Gerard ‘t Hooft, e o físico norte-americano John Wheeler, que encapsulou essa ideia com sua frase evocativa: “it from bit”.

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O cosmos digital quântico: Entre realidade e computação

À medida que nos aproximamos do fim de nosso mergulho cósmico no mundo de Edward Fredkin, é hora de explorar o reino quântico dos universos digitais.

Universo Digital Clássico vs. Universo Quântico

Enquanto Margolus continuou defendendo a versão clássica da teoria do universo digital, há um sentimento predominante: talvez os modelos clássicos simplesmente não sejam suficientes. Eles podem não capturar as complexidades intrincadas do nosso universo. 

Seth Lloyd apontou que a interpretação clássica de Fredkin enfrentou desafios quando confrontada com fenômenos quântico-mecânicos, mas a reviravolta está nas regras computacionais quânticas, que explicam de maneira magnífica fenômenos quânticos desconcertantes, como o emaranhamento.

O emaranhamento é um fenômeno da mecânica quântica no qual dois ou mais sistemas quânticos, como elétrons ou fótons, tornam-se interconectados de tal forma que o estado quântico de um dos sistemas não pode ser descrito independentemente dos estados dos outros, mesmo que os sistemas estejam separados por grandes distâncias.

Avançando para o trabalho de Lloyd

Ele não se contentou apenas em criticar os modelos clássicos; ele tinha suas próprias teorias. Durante a década de 1990 e em seu importante livro de 2006 “Programming the Universe“, ele propôs a ideia revolucionária de um universo digital quântico

O trabalho de Lloyd serve como um farol, mostrando como regras computacionais quânticas podem explicar as próprias leis da física — incluindo a sempre evasiva teoria quântica da gravidade.

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Pode parecer, mas isso não se aproxima da Teoria da Simulação do filósofo sueco Nick Brostom. Uma teoria que sugere que o Universo foi meticulosamente criado por entidades extremamente avançadas, possivelmente como um vasto experimento ou até mesmo um tipo de jogo, uma ideia que Lloyd considera extremamente complexa.

Essa distinção precisa ser feita. O universo digital quântico não sugere que somos todos personagens de um videogame alienígena avançado. Em vez disso, postula que as condições iniciais e regras governantes do nosso universo podem ter emergido naturalmente, semelhante ao Big Bang.

Mas aqui está a pergunta que não quer calar:  A ideia de um universo digital é testável? Poderíamos saber com certeza? Para verificar um universo digital, talvez precisássemos observar o cosmos na escala de Planck. Se o espaço-tempo de fato opera em pedaços quantizados, isso pode se revelar em sutis assinaturas cósmicas, como a forma como a luz se propaga pelos vastos vazios do espaço. 

Mas, para selar o acordo, provavelmente precisaríamos de uma teoria quântica da gravidade, mesclando os princípios da relatividade com peculiaridades quânticas.

Olhando para o futuro

Lloyd menciona que teorias quânticas estão adotando uma abordagem mais computacional. 

Uma delas é o fascinante princípio holográfico de ‘t Hooft, que propõe que o nosso vasto universo tridimensional é na verdade uma projeção de uma realidade em dimensões inferiores, como se tudo ao nosso redor fosse um holograma projetado de um disco. “Há esperança de que essas concepções quânticas do universo digital possam esclarecer alguns dos maiores mistérios da física”, afirma Lloyd.

Mas talvez, o que seja mais intrigante em toda essa jornada é o papel de Edward Fredkin. Ele, com sua perspectiva não convencional, ousou sonhar com um universo diferente, acreditando que foi justamente sua abordagem atípica à física, desprovida dos moldes tradicionais de educação, que lhe permitiu visualizar o universo sob essa lente digital. Lloyd concorda dizendo que se Fredkin tivesse seguido um caminho educacional mais tradicional, talvez não tivesse trilhado terrenos tão inovadores.

No final, seja através das lentes da física, da computação ou da pura curiosidade, a ciência continua sua busca pelo entendimento do universo. Teorias como a do universo digital ampliam nosso horizonte de possibilidades, desafiando nossa compreensão e nos mostrando que quanto mais sabemos… Bem… Menos sabemos!

Fonte: Nature

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